Blog Widget by LinkWithin

2013-10-31

Canção Final - Carlos Drummond de Andrade

Oh! se te amei, e quanto!
Mas não foi tanto assim.
Até os deuses claudicam
em nugas de aritmética.
Meço o passado com régua
de exagerar as distâncias.
Tudo tão triste, e o mais triste
é não ter tristeza alguma.
É não venerar os códigos
de acasalar e sofrer.
É viver tempo de sobra
sem que me sobre miragem.
Agora vou-me. Ou me vão?
Ou é vão ir ou não ir?
Oh! se te amei, e quanto,
quer dizer, nem tanto assim


Carlos Drummond de Andrade (n. Itabira, 31 de Outubro de 1902 — m. Rio de Janeiro, 17 de Agosto de 1987).

Sentimental
Mãos Dadas
Quero
Os Ombros Suportam o Mundo
O amor antigo
Indagação
Amar
Qualquer Tempo
A Língua Lambe
Quarto em Desordem
A Falta de Érico
A Hora do Cansaço

Read More...

Ode Sobre a Indolência - John Keats


“Não trabalham nem fiam”

I

Certa manhã vi três figuras de perfil,
De cabeça inclinada as três, e de mãos juntas;
E vinha uma após outra com sereno andar,
Usando plácidas sandálias, vestes brancas;
Passaram, quais figuras de marmórea urna,
Quando a girarmos para ver o lado oposto;
Voltaram, como quando uma vez mais viramos
A urna, e então retornaram as primeiras formas;
Eram-me estranhas, como em relação a vasos
Pode ocorrer com doutos no saber de Fídias.

II

Como foi que, ó Imagens, não vos conheci?
Como viestes ocultas com tão quieta máscara?
Era silente ardil, bem disfarçado para
Levar furtivo e pôr ociosos os meus dias?
Madura estava a hora sonolenta. A nuvem
Mais que feliz de uma indolência de verão
Entorpeceu-me o olhar; meu pulso fraquejava;
Não doía a dor, nem o prazer tinha inda flores:
Por que não vos fundistes, a deixar-me o espírito
Deserto do que quer que fosse - exceto o nada?

III

Terceira vez passaram perto, e enquanto isso
Voltaram um momento o rosto para mim;
Depois esvaeceram, e, para segui-las,
Ardi e ansiei por asas, pois reconheci-as;
A primeira, formosa virgem, era o Amor;
A segunda, a Ambição, de palidez nas faces
E sempre atenta com seus olhos fatigados;
Na última, que quanto mais censuram tanto
Mais eu amo, donzela, extremamente indócil,
Reconheci o meu demônio, a Poesia.

IV

Esvaeceram, e eu, certo, queria asas;
Ó, loucura! O que é o Amor? e onde está ele?
E essa pobre Ambição! nasce de um breve acesso
De febre no pequeno coração de um homem;
Quanto à Poesia! - ao menos para mim não traz
Prazer que iguale os meios-dias sonolentos
E as tardes cheias de indolência toda mel;
Ó, que a amargura não atinja a minha vida
E assim jamais eu sabia como as luas mudam
Nem ouça a voz intrometida do bom-senso!

V

Por que, ai! terceira vez elas passaram perto?
Meu sono, tinham-no bordado vagos sonhos;
Minha alma tinha sido relva borrifada
Por flores, por inquietas sombras, raios frustros:
Não houve tempestade na manhã nublada,
Com as lágrimas de maio a lhe pender das pálpebras.
Folhas novas de vide opressas na janela
Por onde entrava a tepidez das brotações
E a voz do tordo, ó Imagens! era dar-me adeus!
Em vossas vestes não caíra pranto meu.

VI

Três Fantasmas, adeus! Não me podeis erguer
A fronte de seu fresco leito, a grama em flor,
Não me atrairia ser nutrido com elogios,
Qual cordeiro de estima em farsa emocional!
Desvanecei-vos suaves; sede uma vez mais
Figuras mascaradas na urna sonhadora;
Adeus! Tenho visões para o correr da noite
E para o dia visões débeis e copiosas;
Sumi, Fantasmas, deste espírito indolente,
E entrando pelas nuvens, nunca mais volteis!

in Ode sobre a Melancolia e Outros Poemas. Org. e Trad.: Péricles Eugênio da Silva. São Paulo, Hedra, 2010.

John Keats (n. 31 outubro 1795, Moorgate, Londres, Reino Unido; m. 23 de fevereiro 1821, em Roma, Itália)

Read More...

2013-10-30

Outrora - Alfredo Guisado

Outrora alguém olhou com os meus olhos
E alguém sentiu também com os meus sentidos.
Alguém foi Eu em sonhos derruídos
Alguém viveu de mim ante os teus olhos.

Por isso me vejo, me conheço
De me ter visto outrora no meu Eu.
O meu passado é tudo que adormeço
Tudo o que envolvo em mim e me esqueceu.

E as minhas mãos que no teu sonho exaltas
Outrora para Deus as elevei...
Não tocavam em Deus, eram mais altas.

Minha presença é alma que se ausenta
E o meu passado que ante mim deixei,
Uma cadeira onde ninguém se senta.


in Poemas Portugueses Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI, Porto Editora

Alfredo Pedro de Meneses Guisado nasceu a 30 de Outubro de 1891 em Lisboa, onde faleceu a 2 de Dezembro de 1975.

Recordar
O Baloiço
Um Poema de "Elogio da Desconhecida"
As Exéquias da Princesa II A Princesa a Seus Lábios Durante a Morte
Apagou-se por fim o incerto lume

Read More...

2013-10-29

Tu Queres Sono: Despe-te dos Ruídos - Ana Cristina Cesar (na passagem dos 30 anos sobre o seu desaparecimento)

Tu queres sono: despe-te dos ruídos, e
dos restos do dia, tira da tua boca
o punhal e o trânsito, sombras de
teus gritos, e roupas, choros, cordas e
também as faces que assomam sobre a
tua sonora forma de dar, e os outros corpos
que se deitam e se pisam, e as moscas
que sobrevoam o cadáver do teu pai, e a dor (não ouças)
que se prepara para carpir tua vigília, e os cantos que
esqueceram teus braços e tantos movimentos
que perdem teus silêncios, o os ventos altos
que não dormem, que te olham da janela
e em tua porta penetram como loucos
pois nada te abandona nem tu ao sono.


Ana Cristina Cruz Cesar (Rio de Janeiro, 2 de junho de 1952 — Rio de Janeiro, 29 de outubro de 1983)

Ler da mesma autoria:
Tenho uma folha branca
Sexta Feira da Paixão
Encontro de Assombrar na Catedral 
Final de uma ode

Read More...

2013-10-28

Por Amar-te Tanto - Rui de Noronha


Que culpa terei eu de amar-te assim?
Que culpa terás tu de o não saberes?
Quem adivinha o que se passa em mim?
Como hei-de adivinhar o que tu queres?

Oh! Corações secretos de mulheres!
Oh! Minhas ilusões, mágoas sem fim!
Porque hei-de eu ter só mágoas, não prazeres,
por tanto te querer, doce jasmim?

Tudo, que sob a luz do sol existe,
alegre é num momento e noutro triste,
só eu herdei apenas dor e pranto...

O mais humilde verme, que rasteja,
um outro tem, que o ama, afaga e beija
- e eu nada tenho por amar-te tanto...


António Ruy de Noronha (n. Lourenço Marques, actual Maputo, Moçambique a 28 Out 1909; m. Moçambique 25 Dez 1943).

in A Circulatura do Quadrado - Alguns dos Mais Belos Sonetos de Poetas cuja Mátria é a Língua Portuguesa - Edição UNICEPE - Cooperativa Livreira de Estudantes do Porto, CRL - 2004

Ler, neste blog, do mesmo autor:
Grito de Alma
Mulher

Read More...

2013-10-27

Anti-Soneto - Carlos Queirós

Ao Mário Saa

O nosso drama de portugueses,
O nosso maior drama entre os maiores
Dos dramas portugueses,
É este apego hereditário à Forma:
Ao modo de dizer, os pontinhos nos ii,
Às virgulas certas, às quadras perfeitas,
À estilística, à estética,à bombástica,
À chave de ouro do soneto vazio
- Que põe molezas de escravatura
Por dentro do que pensamos
Do que sentimos
Do que escrevemos
Do que fazemos
Do que mentimos.

(in "Cadernos de Poesia,nº1,1ªsérie,1940)

José Carlos Queiroz Nunes Ribeiro (n. Lisboa 5 Abr 1907; m. 27 Out 1949)

Do mesmo autor, neste blog:
Amizade
Na Cidade Nasci
Erótica
Apelo à Poesia
Uma história vulgar
Pastoral
LIBERA-ME
Canção Grata
Desaparecido

Read More...

2013-10-26

Soneto XXI - António Lobo de Carvalho

Ao mesmo Padre Macedo, que pregando em Santa Joana na ação de
graças quese fez pelo restabelecimento do Conde de S. Vicente,
abateu o Marquês dePombal, tendo-o aí mesmo
 louvado noutras ocasiões

Ontem nessa cadeira da verdade
Por maior dos heróis o conheceste
E no mesmo lugar hoje o fizeste
O monstro mais cruel d’iniquidade!

Explica-nos enfim por piedade,
Já que tanto o exaltaste, e o abateste,
Se é mentira o que então nos propuseste
Ou o que essa oração nos persuade?

Se foi mau, porque teve então louvores?
E se é bom, porque é monstro, e causa medo?
Eu não posso entender tais oradores!

Para mudar o ser é muito cedo
Homem tudo era luz, tudo hoje horrores
Mas enfim, são discursos do Macedo!

in Poesias Joviaes e Satyricas, Cadix, MDCCCLII

António Lobo de Carvalho nasceu em Guimarães, pelos anos de 1730 pouco mais ou menos, tendo falecido em Lisboa a 26 de outubro de 1787




Read More...

2013-10-25

Envelhecer - Humberto de Campos


àrvore Vetusta, Outono

Na manhã da existência, ouvindo o peito,
que previa teu vulto no caminho,
dentro em minha alma levantei teu ninho,
e, nesse ninho, preparei teu leito.

Desceu a tarde, e ainda me viu sozinho.
Murcham as flores que, de leve, ajeito;
de novas rosas tua colcha enfeito,
e o travesseiro, novamente, alinho.

Cai, tristonho, o crepúsculo, na estrada.
Alongo os olhos, atirando um beijo
à forma vaga do teu corpo… E nada!

Recomponho as palavras que não disse.
E, apagando a candeia do Desejo,
adormeço na noite da Velhice.

Humberto de Campos Veras (n. em Miritiba, Maranhão, 25 de outubro de 1886 — m. no Rio de Janeiro, 5 de dezembro de 1934)

Ler neste blog, do mesmo autor:

Read More...

2013-10-24

FIVE O'CLOCK TEAR - Emanuel Félix

Coisa tão triste aqui esta mulher
com seus dedos pousados no deserto dos joelhos
com seus olhos voando devagar sobre a mesa
para pousar no talher
Coisa mais triste o seu vaivém macio
p'ra não amachucar uma invisível flora
que cresce na penumbra
dos velhos corredores desta casa onde mora

Que triste o seu entrar de novo nesta sala
que triste a sua chávena
e o gesto de pegá-la

E que triste e que triste a cadeira amarela
de onde se ergue um sossego um sossego infinito
que é apenas de vê-la
e por isso esquisito

E que tristes de súbito os seus pés nos sapatos
seus seios seus cabelos o seu corpo inclinado
o álbum a mesinha as manchas dos retratos

E que infinitamente triste triste
o selo do silêncio
do silêncio colado ao papel das paredes
da sala digo cela
em que comigo a vedes

Mas que infinitamente ainda mais triste triste
a chávena pousada
e o olhar confortando uma flor já esquecida
do sol
do ar
lá de fora
(da vida)
numa jarra parada


in A Palavra O Açoite (1977)

Emanuel Félix Borges da Silva nasceu em Angra do Heroísmo a 24 de Outubro de 1936 e faleceu no dia 14 de Fevereiro de 2004

Do mesmo autor ler no Nothingandall: Os Búzios

Read More...

2013-10-23

Azar Amoroso - Fabrício Carpinejar

Há dois anos, um amigo conheceu o amor de sua vida em Gramado, num Congresso de Medicina. Ficaram juntos de noite - a noite foi linda, romântica, precisa, perfeita. Deu tudo certo: química, literatura, matemática, geografia, física e história. Gabaritaram a prova da paixão. Ele saiu de madrugada quando ela ainda dormia. Tinha que trabalhar cedo em hospital de Porto Alegre. Deixou uma longa carta na recepção do hotel afirmando que sua busca havia terminado e ela era a mulher que gostaria de passar o resto dos seus dias. Deixou por escrito o desafio: - Se você sente o mesmo, telefone correndo para mim.

Ela nunca telefonou.

Eles se encontraram casualmente na última semana. Depois do abraço, envergonhado, ele perguntou:

- Não me quis, né?

Ela respondeu à queima-roupa:

- Eu? Tá louco? Eu queria, mas você sumiu sem notícias.

O cara descobriu que a recepção do hotel não entregou a carta. A mulher pensou que ele era um canalha, que apenas desejava curtir e que abandonou a cama de fininho para fugir de qualquer compromisso.

A recepção do hotel estragou o romance dos dois. Não confie em recepção de hotel. Não confie também na casualidade. Se você ama alguém, use todos os sinais de reforço: telefone, grite, esperneie. Tire a teima. Melhor ser chato do que enganado pelo azar. A insistência é a nossa maior confidente. Nem sempre o destino ajuda o amor, temos que ajudar o destino.

Extraído do blog do autor aqui

Fabrício Carpi Nejar, poeta e jornalista, mestre em Literatura Brasileira pela UFRGS. Nasceu em Caxias do Sul (RS) aos 23 de outubro de 1972.

Read More...

2013-10-22

Promoção Pingo Doce

OFERTA DE MÁQUINA DE CAFÉ na compra de 15 embalagens de cápsulas de café Pingo Doce...

Já não falta muito para:
- Quem meter 50 litros de gasolina poder levar um carro... (ao preço que está a gasolina!)...
- Quem comprar um vestido ter direito a levar pra casa... a manequim... (especialmente se o vestido for para ela!)

Enfim...

Read More...

Pronominais - Oswald de Andrade

Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da nação brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro


José Oswald de Sousa Andrade Nogueira (n. São Paulo, 11 de janeiro de 1890 — m. São Paulo, 22 de outubro de 1954)

Ler do mesmo autor, neste blog:
Erro de Português
Morro Azul
Canto de Regresso à Pátria
Oferta

Read More...

2013-10-21

Soneto das Nuvens e da Brisa - Waldemar Lopes

Os pássaros nostálgicos.. Errantes,
mágicos do crepúsculo, soprando
das longas asas trêmulas o brando
vento da tarde; e logo, em céus cambiantes,

alvos blocos de pluma ão distantes
e efêmeras imagens modelando:
sereias e hipocampos, entre o bando
de carneiros, e rosas, e elefantes,

cães e estrelas, dragões, ou aguçadas
torres, na superfície roseoviva
por onde voga, acesa, a caravela

e nas longas asas captam, retesadas,
a poesia da tarde, fugitiva,
mas eterna no instante em que foi bela.


in Sonetos do Tempo Perdido, Editora Gurarapes - EGM, 2002
soneto extraído daqui

Waldemar Freire Lopes (Quipapá, Pernambuco, 1 de fevereiro de 1911 — Recife, 21 de outubro de 2006)

Read More...

2013-10-20

Estranho Azul - Paulo Themudo

Parti...
Lentamente a minha alma se foi repartindo
De segredos e imaginação.
Leves e serenos olhares me cercam
No infinito que se esconde.
Fabricamos histórias sem sentido
Porque nos mentimos bem
E a realidade é...
Inútil...
Dos grandes Poetas
Resta a fama. a vã gloria,
Deitada agora num lugar qualquer.
Parti...
Conhecer esse paraíso de que todos falavam
E que foi sempre fruto dos sonhos
Rumor dos encantos.
Mas mesmo assim... Decidi,
Que a morte padecia sobre a vida
E que da vida pouco resta
Senão o tingir dos dias,
Que nos alegram, desiludem, enriquecem.
E cada dia é uma despedida
Ao mundo.
Fabricamos histórias
Para conseguir alguma luz,
Preencher com cor
O que se perdeu.
Aqui...
Já não sou quem era,
Não me engano
E esta foi a vida que eu escolhi.
Parti... Daqui.


Paulo Themudo Gomes nasceu a 20 de Outubro de 1968 em Matosinhos

Read More...

2013-10-19

Soneto de Separação - Vinícius de Moraes (na passagem do centenário do nascimento)

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.


Extraído de Vinicius de Moraes - Antologia Poética, Publicações Dom Quixote

Vinicius de Moraes (n. Rio de Janeiro a 19 Out 1913; m. Rio de Janeiro, 9 Jul 1980)

Ler neste blog do/sobre o autor:
A Ausente
Sonata do Amor Perdido
Se o amor quiser voltar
Saudades do Brasil em Portugal
Soneto do Amor Total
Poética I
Mar
Poema de Todas as Mulheres
Soneto de Fidelidade
Pela luz dos olhos teus
Dialectica
Aquarela
Amigos
Vinícius de Morais (n. 1913 m. 9 Jul 1980)

Read More...

2013-10-18

Quando ?! ... - Casimiro de Abreu

Não era belo, Maria,
Aquele tempo de amores,
Quando o mundo nos sorria,
Quando a terra era só flores
Da vida na primavera?
- Era!

Não tinha o prado mais rosas,
O sabiá mais gorjeios,
O céu mais nuvens formosas,
E mais puros devaneios,
A tua alma inocentinha?
- Tinha!

E como achavas, Maria,
Aqueles doces instantes
De poética harmonia
Em que as brisas doudejantes
Folgavam nos teus cabelos?
- Belos!

Como tremias oh! Vida,
Se em mim os olhos fitavas!
Como eras linda, querida,
Quando d'amor suspiravas
Naquela encantada aurora!
- Ora!

E diz-me: não te recordas
- Debaixo do cajueiro -
Lá da lagoa nas bordas
Aquele beijo primeiro?
Ia o dia já findando ...
- Quando?!...

Casimiro José Marques de Abreu (n. na fazenda da Prata, no actual município de Silva Jardim (RJ), em 4 de Jan de 1839; m. na fazenda do Indaiaçu, no atual município de Casimiro de Abreu (RJ), em 18 de Out. de 1860).

Ler do mesmo autor:
Clara
A Valsa
Canção do Exílio
Meus oito anos
Amor e Medo
Minh'alma é triste I
Minh'alma é triste III
Canto de Amor IV

Read More...

2013-10-17

Ninguém me disse: Vai por este caminho de água - António Ramos Rosa

Ninguém me disse: Vai por este caminho de água
ou Segue esta vereda silenciosa
Eu vivia na obscuridade com uma lâmpada negra
e a tortura do infinito na minha cabeça esguia
Mas eu amava os muros com insectos e urtigas
e os campos de verdura leve e os límpidos regatos
Era um homem da terra que queria pertencer à terra
e consagrá-la numa relação viva e fértil
Eu queria construir com a matéria espessa
um edificio solar com amplas vidraças
e um terraço aberto à dinâmica languidez do mar
Não sei se o que fiz tem a solidez flexível
de um corpo vegetal mas com extensas pedras
Os que o habitarem talvez se deslumbrem com as claras planícies
e amem a tranquilidade misteriosa dos vales obscuros
Mas para mim não é mais que um amontoado de folhas
algumas verdes outras secas e todas o vento varrerá


in O Deus da Incerta Ignorância: Seguido De Incertezas Ou Evidencias (2001)

António Víctor Ramos Rosa nasceu em Faro a 17 de Outubro de 1924, faleceu em Lisboa a 23 de setembro de 2013

Ler do mesmo autor neste blog:
A Festa do Silêncio
Este Viver Comum
Vertentes;
Não posso adiar o amor...
Poema Dum Funcionário Cansado

Read More...

2013-10-16

A Chave do Abismo: VII - Ricardo Dicke

Sei a hora em que a tarde úmida
penetra nos ossos
sei a hora em que o sol de inverno
se adentra no sangue
sei a hora em que a última luz
cala fundo no coração
sei a hora em que a íntima pulsação
da tarde cede lugar
à íntima pulsação do nascimento da noite
sei a hora em que se quebram os sentidos
silenciosamente e no segredo a alma
toma súbito conhecimento da beleza do abismo
e do abismo da morte
sei a hora da última devoção adoração
e do suave último êxtase bálsamo
que brotam dos murmúrios de Deus


Ricardo Guilherme Dicke, nasceu em 16 de outubro de 1936 em Chapada dos Guimarães, Mato Grosso; faleceu a 9 de julho de 2008 em Cuiabá, Mato Grosso.




Read More...

2013-10-15

Noite de Sonhos Voada - Manuel da Fonseca

Noite de sonhos voada
cingida por músculos de aço,
profunda distância rouca
da palavra estrangulada
pela boca armodaçada
noutra boca,
ondas do ondear revolto
das ondas do corpo dela
tão dominado e tão solto
tão vencedor, tão vencido
e tão rebelde ao breve espaço
consentido
nesta angústia renovada
de encerrar
fechar
esmagar
o reluzir de uma estrela
num abraço
e a ternura deslumbrada
a doce, funda alegria
noite de sonhos voada
que pelos seus olhos sorria
ao romper de madrugada:
— Ó meu amor, já é dia!...

in "Poemas Dispersos"

Manuel Lopes Fonseca (n. em Santiago do Cacém a 15 Out 1911 ; m. em Lisboa a 11 Mar 1993)

Ler do mesmo autor:
Antes que seja tarde
Poema da Menina Tonta
Depois vinha o luar...
Estradas
Segundo dos Poemas de Infância
Ruas da Cidade
Os olhos do poeta
Romance do terceiro oficial de finanças

Read More...

2013-10-14

Santa Catarina - Biase Faraco (na passagem do centenário do seu nascimento)

Barrigas-verdes, todos nós, por certo,
Amamos nossa terra estremecida,
Orgulhosos da imagem colorida
De um zimbório de glórias recoberto.

Que lindo céu... Que plaino azul deserto...
Nele o sol passa, abençoando a lida
Dos filhos desta terra tão querida,
A quem também um grande amor oferto.

As verdes brenhas, a elevada serra
Selam o coração de nossa terra.
Na costa nívea o vasto mar encanta.

Tantos adornos, dotes tão garbosos
E nós bem nos sentimos orgulhosos
Por sermos filhos desta terra santa.


(in Anuário Catarinense, acervo do IHGSC)

Extraído de: Ventos do Sul
Revista do Grupo de Poetas Livres - Difundindo a poesia e fazendo amigos
Florianópolis - SC - Ano IV - Julho, Agosto e Setembro de 2002 - Nº 16

Biase Agnesino Faraco nasceu em 14 de outubro de 1913 em Florianopolis, Santa Catarina e faleceu em 20 de janeiro de 1980.

Read More...

2013-10-13

Teresa - Manuel Bandeira (que faleceu há 45 anos)

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.

Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho, nasceu na cidade do Recife, Pernambuco, no dia 19 de abril de 1886 e faleceu no dia 13 de outubro de 1968.

Ler do mesmo autor, neste blog:
O Último Poema
Tema e Variações
Momento num café
Hiato
Desencanto
A Onda
Antologia
Maçã

Read More...

2013-10-12

Música Submersa - Helena Kolody

Não quero ser o grande rio caudaloso
Que figura nos mapas.
Quero ser o cristalino fio d’água
Que canta e murmura na mata silenciosa.

Helena Kolody (Cruz Machado, 12 de outubro de 1912 — Curitiba, 15 de fevereiro de 2004)

Read More...

Lembranças - Ruy Cinatti

Chorar pelos vivos que falecem
é natural – coisa lacrimal.
A carne sente a falta do costume
às tantas … tem fome.
Não choro ninguém.

Quando digo chorar é outra pressa
de chegar a tempo
da conversa atenta com um amigo
que nos quer bem.

Chorar por ninguém é chorar pelos vivos
que já morreram, sem o saber,
e vivem no seu presídio.

O resto, repito, é fisiologia
provocada, e ainda bem, pelo riso,
ou pela dor que temos de já ter nascido
e sermos chorados por alguém.


in Cem Poemas Portugueses do Adeus e da Saudade
selecção, organização e introdulção de José Fanha e José Jorge Letria
Terramar

Ruy Cinatti Vaz Monteiro Gomes (Londres, 8 de Março de 1915 — Lisboa, 12 de Outubro de 1986)

Ler do mesmo autor, neste blog: Vigília
Quando o Amor Morrer Dentro de Ti

Read More...

Saudade - Fernando Semana

Estava bem contente sem ter de pensar
Como? Não sei. Porquê? Nem intento saber…
É pecado querer um dia desfrutar,
Do sol e das estrelas, do mar, sem te ver?

Sem te ver realmente na imaginação
Já que na realidade há muito partiste
Recoloco os fragmentos do vil coração
Que como nem porquê, não sei, inda resiste...

Ontem, à noite, senti estar a melhorar
-Tal alcoólico anónimo após a sessão -
Não abracei a almofada, na cama, ao deitar!…

Hoje, escutava um Fado, já me senti triste
- certamente tratou-se de uma regressão-
Saudade de ti… como dói e porque persiste…

Fernando Semana, economista, nasceu em Valbom, concelho de Gondomar, a 12 de outubro de 1957


Read More...

2013-10-11

A Fonte Romana - Conrad Ferdinand Meyer

Jorra p'ra o alto o jacto, e, ao cair,
Enche a marmórea taça até À borda.
E esta, coifando-se de um véu, desborda.
P'ra a outra taça a seguir:
Estoutra, já por de mais rica.
Dá À terceira a onda refluente,
E cada qual recebe e dá conjuntamente
E transborda e fica.


Trad. Paulo Quintela

in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o Futuro, Porto Editora
Conrad Ferdinand Meyer (Zurique, 11 outubro 1825 – Kilchberg, 28 novembro 1898)

Read More...

2013-10-10

Pórtico - Antonio Tavernard

Eu quisera, em meus versos, a alvorada
de todas as belezas triunfais...
que eles tivessem a auréola imaculada
do sol de madrugada...
e que neles cantassem sabiás...
que fossem álacres como pensamentos
de crianças em férias, mais vibrantes
que pendões de palmeiras drapejantes
às carícias brutais, bruscas dos ventos
e mais ardentes do que dois amantes
no seu beijo melhor...deslumbramentos
de meios-dias tropicais fulgissem
em suas estrofes como luz das gemas...
que ora murmurassem, rugissem...
e semeassem bênçãos e anátemas...


Antônio de Nazaré Frazão Tavernard nasceu na Vila São João de Pinheiro, atual Icoaraci, em Belém, Pará, a 10 de outubro de 1908 — m. Belém a 26 de maio de 1936

Duplicidade
Última Carta

Read More...

2013-10-09

A Serra do Rola-Moça - Mário de Andrade (na passagem dos 120 anos do seu nascimento)


A Serra do Rola-Moça
Não tinha esse nome não...

Eles eram do outro lado,
Vieram na vila casar.
E atravessaram a serra,
O noivo com a noiva dele
Cada qual no seu cavalo.

Antes que chegasse a noite
Se lembraram de voltar.
Disseram adeus pra todos
E se puseram de novo
Pelos atalhos da serra
Cada qual no seu cavalo.

Os dois estavam felizes,
Na altura tudo era paz.
Pelos caminhos estreitos
Ele na frente, ela atrás.
E riam. Como eles riam!
Riam até sem razão.

A Serra do Rola-Moça
Não tinha esse nome não.

As tribos rubras da tarde
Rapidamente fugiam
E apressadas se escondiam
Lá em baixo nos socavões,
Temendo a noite que vinha.

Porém os dois continuavam
Cada qual no seu cavalo,
E riam. Como eles riam!
E os risos também casavam
Com as risadas dos cascalhos,
Que pulando levianinhos
Da vereda se soltavam,
Buscando o despenhadeiro.

Ali, Fortuna inviolável!
O casco pisara em falso.
Dão noiva e cavalo um salto
Precipitados no abismo.
Nem o baque se escutou.
Faz um silêncio de morte,
Na altura tudo era paz ...
Chicoteado o seu cavalo,
No vão do despenhadeiro
O noivo se despenhou.

E a Serra do Rola-Moça
Rola-Moça se chamou.


Mário Raul de Morais Andrade (n. em São Paulo, a 9 de Out de 1893; m. em São Paulo a 25 de Fev. de 1945)

Read More...

2013-10-08

Citação do dia

Nós não temos políticos. Nós temos vagabundos, ladrões e canalhas!

(popular anónimo a propósito do... Brasil) - e bem extensível a outros países de idêntica língua, suponho eu...

Read More...

Interferência - Alberto de Serpa

A Cecília Meireles

Quem veio bater a minha porta? Quem?
Quem me fez abrir a janela e a noite morta?

O caminho estava deserto e o seu silêncio tinha horas.
Vento? Esta noite tem a paz e o sossego da morte.
Só eu e as estrelas sentíamos a solidão fantástica...

Nos ouvidos e na ansiedade guardei o rumor que me chamou,
as minhas mãos tiveram a carícia doutras mãos perdidas,
e uma companhia invisível acendeu uma luz na minha alma...

Alguém terá pensado em mim, longe?

(A Vida é o Dia de Hoje, 1939)
in Poemas Portugueses Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI; Porto Editora

Alberto de Serpa Esteves de Oliveira (nasceu no Porto a 12 de Dezembro de 1906 - m. na mesma cidade a 8 de Outubro de 1992)

Ler do mesmo autor, neste blog:
Amores Infelizes
Incerteza
Um Jovem Camarada
Poema III
Névoa

Read More...

2013-10-07

Requiem - Cristovam Pavia (na passagem dos 80 anos sobre o nascimento do poeta)

(ao menino morto, eu próprio)

A tarde declina com uma luz ténue.
Estou grave e calmo.
E não preciso de ninguém
Nem a luz da tarde me comove: entendo-a.
Até as imagens me são inúteis porque contemplo tudo.

Os ventos rodam, rodam, gemem e cantam
E voltam. São os mesmos.
Como os conheço desde a infância!
E a terra húmida das tapadas da quinta...
O estrume da égua morta quando eu tinha seis anos
Gira transparente nesta brisa fria...
(Na noite gotas de orvalho sumiam-se sob as folhas das ervas)
Oh, não há solidão, nas neblinas de inverno
Pela erma planície...

E foi engano julgar-te morto e tão só nas tapadas em silêncio...

Agora sei que vives mais
Porque começo a sentir a tua presença, grande como o silêncio...
Já me não vem a vaga tristeza do teu chamamento longínquo
Já me confundo contigo.

Cristovam Pavia é o pseudónimo literário de Francisco António Lahmeyer Flores Bugalho, nascido na freguesia de Alcântara, Lisboa a 7 de Outubro de 1933 e faleceu na mesma cidade a 13 de Outubro de 1968.

Ler do mesmo autor:
Não fugir. Suster o peso da hora
O poema que hei-de escrever para ti 
Na noite da minha morte

Read More...

2013-10-06

Musical suggestion of the day: Amália Rodrigues - Nearness of you

Quanto mais se conhece sobre Amália Rodrigues, mais ficamos impressionados e surpreendidos. Esta é uma fabulosa interpretação da canção escrita em 1938 por Hoagy Carmichael, com letra de Ned Washington. Miguel Esteves Rodrigues divulgou-a no seu programa da Antena 1 «Se as canções falassem» e fiquei, logo à primeira audição, tão fascinado com a interpretação de Amália... que no mesmo dia comprei o álbum «American Songs» no Itunes!

Aí vai...



Amália da Piedade Rebordão Rodrigues (Lisboa, 1 jul 1920* - Lisboa, 6 out. 1999)

*nos registos oficiais conta a data de 23 de julho de 1920 mas Amália sempre assumiu ser a de 1 de julho)

Read More...

2013-10-05

O Hissope Poema Herói-Cómico - Do Canto Terceiro (extracto) - António Dinis da Cruz e Silva

Já na soberba mesa cem terrinas,
O vapor mais suave derramando,
A insaciável gula provocavam,
Quando chegam ao cheiro os convidados,
Que, feitos os devidos comprimentos,
Sem distinção, em torno, se assentaram.
Começam a chover logo os manjares,
Cem perdizes, cem pombos vêm voando,
Cem espécies de molhos, cem de assados,
Grandes tortas, timbales, pastéis, cremes
Cobrem com simetria a grande mesa:
A cabeça não falta da vitela,
Nem do gordo animal a curta perna,
Cozida em branco leite, ou doce vinho;
Mil frutas, mil corbelhas, mil compotas
A terceira coberta logo adornam;
E em dourados cristais, ó loução Baco,
De tuas plantas brilha o roxo sumo.
Entretanto na porta do palácio,
A cem pobres o bicho da cozinha,
Por ordem do pastor caritativo,
Um caldeirão de caldo repartia.

[...]

O bom cónego, vendo os grossos tomos;
De prazer, em si próprio, não cabia:
Julgando, pelo vulto dos volumes,
Que seria qualquer autor de arromba;
E, sem demora, ordena lhe tragam,
Para um voto lançar, que semelhante
Nas decisões da Rota não se encontre;
Papel de Holanda, penas, e tinteiro;
E para que completo em tudo fosse,
A Roda da Fortuna, e Cristais d’alma
Trazer manda também, fazendo conta
De em partes lhe cerzir alguns pedaços,
Que encantado o deixaram quando os lera.
Isto ordenado, para a banca chega,
O lenço tira, o grosso monco assoa,
Toma tabaco, escarra, os livros abre,
E a folhear começa. Porém, vendo
Que nada entende do que está escrito,
Para a ceia se chega, e enchendo a pança,
Se foi a repousar no brando leito.

[...]
Extraído de Poemas Portugueses Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI
Porto Editora

António Diniz da Cruz e Silva (n. Lisboa 1731 – m. Rio de Janeiro, 5 Outubro de 1799)

Ler do mesmo autor, neste blog:
 Soneto IV
Soneto LXXIV

Read More...

2013-10-04

Que destruo - José-Alberto Marques


destruo a letra
o teu nome.todas as manhãs
eu sei que vou destruir
letra a letra.eu sei o teu nome.

eu destruo e sei letra a letra.
eu sei o teu nome.
eu destruo a letra.que letra sei do teu nome?
todas as letras de manhã.eu
sei o nome que destruo.

reinvento vogal a vogal
a tua imagem.eu sei.e as consoantes
todas as tardes.e todas as noites
reinvento a tua imagem eu sei. as
vogais todas as tardes.e as consoantes
todas as noites do teu nome letra a letra.

abro o peito segredo a segredo.eu sei
que de manhã destruo a noite.e rein-
vento o corpo letra a letra no sangue:
a tua imagem.

vogal a vogal reinvento o peito
letra a letra.todas as manhãs
eu sei o teu nome

José Alberto Marques, nasceu a 4 de Outubro de 1939, em Torres Novas

Read More...

World Animal Day



Do Something Special Today for the Animals in your Life

World Animal Day - a special opportunity for anyone who loves animals

World Animal Day is celebrated each year on 4 October. On this day, animal life in all its forms is celebrated, and special events are planned on locations all over the globe. This date was originally chosen for World Animal Day because it is the feast day of Francis of Assisi, a nature lover and patron saint of animals and the environment.

So, watch this:

Read More...

2013-10-03

Zelos - Zeferino Brazil

Lírios rosa, Eliomar Ribeiro


De leve, beijo as suas mãos pequenas,
Alvas, de neve, e, logo, um doce, um breve,
Fino rubor lhe tinge a face, apenas
De leve beijo as suas mãos de neve.

Ela vive entre lírios e açucenas,
E o vento a beija, e, corno o vento, deve
Ser o meu beijo em suas mãos serenas,
— Tão leve o beijo, como o vento é leve.. .

Que essa divina flor, que é tão suave,
Ama o que é leve, como um leve adejo
De vento ou como um garganteio de ave,

E já me basta, para meu tormento,
Saber que o vento a beija, e que o meu beijo
Nunca será tão leve como o vento...


Zeferino Antônio de Souza Brazil, nasceu em 24 de Abril de 1870, em Porto Grande, Taquari, Rio Grande do Sul e faleceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul a 3 de Outubro de 1942).

Ler do mesmo autor, neste blog:
Formosura Ideal;
Mãe Natureza;
Na Alcova
Ser Pedra! Não Sofrer Nem Amar, Que Ventura;
Os Torturados.

Read More...

Musical suggestion of the day: Um Chão de Giz - Zé Ramalho



Eu desço dessa solidão
Espalho coisas sobre
Um Chão de Giz
Há meros devaneios tolos
A me torturar
Fotografias recortadas
Em jornais de folhas
Amiúde!
Eu vou te jogar
Num pano de guardar confetes
Eu vou te jogar
Num pano de guardar confetes...

Disparo balas de canhão
É inútil, pois existe
Um grão-vizir
Há tantas violetas velhas
Sem um colibri
Queria usar quem sabe
Uma camisa de força
Ou de vênus
Mas não vou gozar de nós
Apenas um cigarro
Nem vou lhe beijar
Gastando assim o meu batom...

Agora pego
Um caminhão na lona
Vou a knock-out outra vez
Prá sempre fui acorrentado
No seu calcanhar
Meus vinte anos de "boy"
That's over, baby!
Freud explica...

Não vou me sujar
Fumando apenas um cigarro
Nem vou lhe beijar
Gastando assim o meu batom
Quanto ao pano dos confetes
Já passou meu carnaval
E isso explica porque o sexo
É assunto popular...

No mais estou indo embora!
No mais estou indo embora!
No mais estou indo embora!
No mais!...

Zé Ramalho, mais precisamente José Ramalho Neto, nasceu a 3 de outubro de 1949 em Brejo do Cruz, Paraíba

Read More...

2013-10-02

Sobre Um Ditado Antigo - Rodrigo Garcia Lopes


Vou dizer de novo o que disseram
Para que a mente nunca esqueça
Que um dia, folhas, nossos lábios se fizeram
Relva, céu veloz, veludo e névoa espessa.

Essa fumaça no vazio é parecida
com a outra que, vida,
dura como dura o raio, quartzo
que uma pupila dilata e irradia.

Quem diria, por exemplo,
que sob a carne do incenso,
no durame da tarde,
o sândalo respira
sem fazer nenhum escândalo.


in VISIBILIA (Sette Letras, 1997)

Rodrigo Garcia Lopes nasceu em Londrina, Paraná, Brasil, a 2 de outubro de 1965.

Ler do mesmo autor: Fugaz

Read More...

2013-10-01

Cada instante é um lugar perdido em que te entregas - José Rui Teixeira

Cada instante é um lugar perdido em que te entregas
à passagem do tempo. A juventude é um vício
que perdemos inevitavelmente. Dizes: é breve o amor,
efémera a vida.

Somos uma estância museológica,
algo anacrónico que aprende a perdurar por medo
de morrer. Toca-me, conjuga um verbo que conheças
no presente do indicativo, soletra-o na segunda pessoa
do singular ao meu ouvido, dá-me qualquer coisa
que me pareça eterno.

Basta-me que o teu olhar me encontre.


in Para Morrer, Quasi

José Rui Teixeira nasceu no Porto em 21 de Setembro de 1974.

Read More...