Mahmoud Darwish
só me resta
perder-me pela tua sombra, que é a minha.
só me resta
habitar a tua voz, que é a minha.
afastei-me da cruz estendida
como claridade em horizonte que não se inclina
até ao mais minúsculo monte que a vista alcança
mas não achei minha ferida, minha liberdade.
porque não sei onde moras
não encontro o caminho,
e porque meu dorso não se apoia em ti com pregos
inclinei-me tanto
como teus céus fazem
a quem espreita de escotilhas de avião
devolve-me os pedaços do meu nome
para que possa convocar as fibras das árvores
devolve-me as letras do meu rosto
para que possa chamar as tempestades próximas
devolve-me as razões do meu prazer
para que possa invocar esse regresso sem razão
porque a minha voz está seca como pau de bandeira
e a minha mão vazia como o hino nacional
porque a minha sombra é ampla como se fora uma festa
e os traços do meu rosto se passeiam de ambulância,
porque eu não sou mais do que isto:
o cidadão de um reino que não nasceu ainda.
Tradução de Adalberto Alves
in Rosa do Mundo, 2001 Poemas para o Futuro, Assírio & Alvim
Mahmoud Darwish محمود درويش (n. Al-Birweh, 13 Mar. 1942 - m. Houston, 9 de agosto de 2008)
1 comments:
Olhos de Mel
disse...
Querido Fernando; achei o poema surpreendente e maravilhoso! Um enígma que só depois de 2 leituras descobrir. Bom fim de semana! Beijos
Enviar um comentário