Pepa (excerto) - Antero de Quental
Dá-me pois olhos e lábios;
Dá-me os seios, dá-me os braços;
Dá-me a garganta de lírio;
Dá-me beijos, dá-me abraços!
Empresta-me a voz ingénua
Para eu com ela orar
A oração de meus cantos
De teu seio no altar!
Empresta-me os pés, gazela,
Para que eu possa correr
O vasto mundo que se abre
Num teu rir, num teu dizer!
Presta-me a tua inocência,
Para eu ir ao céu voar, ..
Mas acende cá teus olhos
Para que eu possa voltar!
Por Deus to peço, senhora,
Que tu mo queiras fazer;
Dá-me os cílios de teus olhos
Para eu adormecer;
Por que, enquanto os tens abertos,
Sempre para aqui a olhar,
Não posso fechar os meus,
E sempre estou a acordar!
Pela Santa-Virgem peço
Que tu me queiras sorrir;
Porque eu tenho um lírio d'ouro
Há três anos por abrir,
E, se lhe deres um riso,
Há-de cuidar que é a aurora ...
E talvez que o lírio se abra,
Talvez que se abra nessa hora!
Por Alá, minha palmeira!
Quando ao sol me for deitar,
Faze sombra do meu lado ...
Porque eu quero-te abraçar!
D'amor te requeiro, ondina,
Quando te fores a erguer,
Ver-te no espelho das fontes ...
Porque eu quero-te beber!
Poema extraído de "Beija-me - uma antologia literária", 101 Noites 2007
Antero Tarquínio de Quental (n. em Ponta Delgada, 18 de Abril de 1842 - m. 11 de Setembro de 1891)
Ler do mesmo autor, neste blog: Palácio da Ventura; Mors-Amor ; Idílio.
0 comments:
Enviar um comentário