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2013-04-02

Visão do futuro - Paulo Gonçalves


Falar do coração! Mas ainda não se disse
Que à nossa espera à porta da velhice
Há uma figura estranha e dolorosa
Que um crepúsculo roxo apoteosa
De túnica lilás e tranças pretas
Numa coroa de violetas.

O viajor não transpõe a passagem medonha
Antes que aos pés dessa mulher deponha
Uma recordação qualquer da mocidade:
É ela, a deusa romântica, a Saudade!

Quem foi feliz mesmo por um minuto
Deve à deusa esse lírico tributo.

Há certos corações que ao passar pela porta
Deixam como oferenda uma ventura morta.
Os pobres de ventura oferecem, apenas,
Um sonho que floriu no intervalo das penas.

Dizem os corações amantes: "Eu só pude
Colher um beijo em minha juventude".
"E eu, tantos corações me inspiraram afeto,
Que eu nem vos sei dizer qual foi o predileto".

"E eu, só vos posso dar, como oferta sagrada,
Este nome de alguém que amei sem dizer nada".
"E eu, a lembrança de um idílio à luz da lua"...
"E eu, duas vidas, porque alguém me deu a sua".

Se chegar minha vez, o que pouco suponho,
Ao encontrar na porta um coração tristonho,
Tímido, a recordar seus amores falazes,
A Saudade talvez pergunte: "E tu que trazes,
Para recordação de teus últimos dias?"

E eu, só lhe mostrarei, chorando,
As mãos vazias!

Poema extraído daqui

Francisco de Paula Gonçalves, de pseudonimo literário Paulo Gonçalves (n. Santos, 2 de abril de 1897 - m. Santos, 8 de abril de 1927)


1 comments:








Luma Rosa

disse...

Que triste não ter um amor para recordar!
Haverá alguém que nunca amou?

Boa semana!!
Beijus,