Na passagem do 81º aniversário de David Mourão-Ferreira
Soneto do Cativo
Se é sem dúvida Amor esta explosão
de tantas sensações contraditórias;
a sórdida mistura das memórias,
tão longe da verdade e da invenção;
o espelho deformante, a profusão
de frases insensatas, incensórias;
a cúmplice partilha nas histórias
do que os outros dirão ou não dirão;
se é sem dúvida Amor a cobardia
de buscar nos lençóis a mais sombria
razão de encantamento e de desprezo;
não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso!
David de Jesus Mourão-Ferreira (n. em Lisboa a 24 Fev. 1927; m. Lisboa a 16 Jun 1996)
David Mourão Ferreira foi o autor de muitos fados para Amália Rodrigues e que outros fadistas têm interpretado. Ouçamos aqui Mariza no fado Primavera
Primavera
Todo o amor que nos prendera,
como se fôra de cera
Se quebrava e desfazia.
:Ai funesta primavera
quem me dera quem nos dera
ter morrido nesse dia.:
E condenaram-me a tanto
viver comigo o meu pranto
viver, viver e sem ti
:Vivendo sem no entanto
eu me equecer desse encanto
que nesse dia perdi.:
Pão duro da solidão
é somente o que nos dão,
o que nos dão a comer.
Que importa que o coração
diga que sim ou que não,
se continua a viver.
Todo o amor que nos prendera
se quebrara e desifzera
em pavor se convertia
Ninguem fale em primavera
quem me dera quem nos dera
ter morrido nesse dia.
Ler do mesmo autor:
Equinócio
Nocturno
Paraíso
Presídio
Penélope
Ternura
Labirinto
E por vezes
Penelope
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