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2013-02-07

Ao Pé do Túmulo - Auta de Souza

Eis o descanso eterno, o doce abrigo
Das almas tristes e despedaçadas;
Eis o repouso, enfim; e o sono amigo
Já vem cerrar-me as pálpebras cansadas.

Amarguras da terra! eu me desligo
Para sempre de vós... Almas amadas
Que soluças por mim, eu vos bendigo,
Ó almas de minh’alma abençoadas.

Quando eu d’aqui me for, anjos da guarda,
Quando vier a morte que não tarda
Roubar-me a vida para nunca mais...

Em pranto escrevam sobre a minha lousa:
"Longe da mágoa, enfim, no céu repousa
Quem sofreu muito e quem amou demais".



Auta de Souza (Macaíba, 12 de setembro de 1876 — Natal, 7 de fevereiro de 1901)

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2013-02-06

GUMES DE NÉVOA - José Craveirinha


Lágrimas?
Ou apenas dois intoleráveis
ardentes gumes de névoa
acutilando-me cara abaixo?


José João Craveirinha (Lourenço Marques, atual Maputo, 28 de Maio de 1922 — Maputo, 6 de Fevereiro de 2003)

Ler do mesmo autor neste blog:
Karingana ua Karingana
Um Homem Não Chora
Aforismo
Eu Quero Ser Tambor





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2013-02-05

A Mocidade - Simões Dias


Eu tinha um berço de rosas
Que minha mãe embalava;
Lembram-me ainda as cantigas
Que ao pé do berço cantava:

«Quem me ouvir assim cantando
Cuidará que estou alegre
Trago o coração mais negro,
Que a tinta com que se escreve.»

«Mas quem tem filhos pequenos
Por força lhe há de cantar
Quantas vezes as mães cantam
Com vontade de chorar!»

Ainda agora se escuto
Ás vezes esta cantiga,
Riem-se todos e eu choro
Não sei por que, doce amiga!

Lembram-me os dias felizes,
Os dias da mocidade,
As infantis inocências
Da minha primeira idade.

Lembra-me a face vermelha,
Que tinhas, quando me deste
Um dia de manhã cedo
Aquele beijo celeste!

Era o primeiro: coraste,
O beijo fez-te mais linda.
Depois fugiste. Recordas-te?
Eu lembro-me tanto ainda!

Da fita do teu pescoço
Pendia a cruzinha d'oiro;
Colete branco velava
Das pomas o alvo tesoiro.

Vê se te lembras: que tempos!
Nem tu sabes que saudades
Eu tenho, quando medito
Nessas primeiras idades.

Tu só me vales; se às vezes
Me vês triste e pensativo
Tu que me doiras os ferros,
Em que me vejo cativo!

Se te vejo, vejo a boca
Daquela que me beijava
Se cantas, ouço as cantigas
Que minha mãe me cantava.

Se me aconchegas ao seio
Os seios dela senti;
Se me levas à tua cama
Vejo o berço onde nasci.

Bendita sejas. No mundo
Vales-me tu na suadade
Tu só me tornas aos dias
Felizes da mocidade.

in O Mundo Interior, 2ª Edição melhorada, págs. 82 a 85
Coimbra. Imprensa da Universidade 1867

José Simões Dias (nasceu na Benfeita, Arganil, a 5 de Fevereiro de 1844 e morreu em Lisboa a 3 de Março de 1899).

Ler do mesmo autor neste blog:
Sol entre nuvens
O Teu Lenço

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2013-02-04

Não Te Amo - Almeida Garret


Não te amo, quero-te: o amar vem d'alma.
E eu n'alma - tenho a calma,
A calma - do jazigo.
Ai! não te amo, não.

Não te amo, quero-te: o amor é vida.
E a vida - nem sentida
A trago eu já comigo.
Ai! não te amo, não!

Ai! não te amo, não; e só te quero
De um querer bruto e fero
Que o sangue me devora,
Não chega ao coração.

Não te amo. És bela; e eu não te amo, ó bela.
Quem ama a aziaga estrela
Que lhe luz na má hora
Da sua perdição?

E quero-te, e não te amo, que é forçado,
De mau feitiço azado
Este indigno furor.
Mas oh! não te amo, não.

E infame sou, porque te quero; e tanto
Que de mim tenho espanto,
De ti medo e terror...
Mas amar!... não te amo, não.
Extraído de Poemas Portugueses, Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI, Porto Editora

João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett (n. no Porto a 4 de Fev. 1799; m. em Lisboa 9 Dez. 1854)

Ler do mesmo autor:
A Rosa - Um Suspiro
Os Meus Desejos
Seus Olhos
Este Inferno de Amar
Rosa sem Espinhos
Seus Olhos
Destino
Não És Tu

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2013-02-01

ESTELA E NIZE - Alvarenga Peixoto

Eu vi a linda Estela, e namorado
Fiz logo eterno voto de querê-la;
Mas vi depois a Nize, e é tão bela,
Que merece igualmente o meu cuidado.

A qual escolherei, se neste estado
Não posso distinguir Nize de Estela?
Se Nize vir aqui, morro por ela;
Se Estela agora vir, fico abrasado.

Mas, ah! que aquela me despreza amante,
Pois sabe que estou preso em outros braços,
E esta não me quer por inconstante.

Vem, Cupido, soltar-me destes laços,
Ou faz de dois semblantes um semblante,
Ou divide o meu peito em dois pedaços!


Inácio José de Alvarenga Peixoto (Rio de Janeiro, 1 de Fevereiro 1742/1744 — Ambaca, Angola, 27 de Agosto 1792 ou 1 de Janeiro 1793)

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