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2012-11-27

Amor e Eternidade - Soares de Passos

Repara, doce amiga, olha esta lousa,
E junto aquela que lhe fica unida:
Aqui dum terno amor, aqui repousa
O despojo mortal, sem luz, sem vida.
Esgotando talvez o fel da sorte,
Puderam ambos descansar tranquilos;
Amaram-se na vida, e inda na morte
Não pôde a fria tumba desuni-los.
Oh! quão saudosa a viração murmura
         No cipreste virente
Que lhes protege as urnas funerárias!
E o sol, ao descair lá no ocidente,
         Quão belo lhes fulgura
         Nas campas solitárias!
Assim, anjo adorado, assim um dia
De nossas vidas murcharão flores...
Assim ao menos sob a campa fria
Se reunam também nossos amores!
Mas que vejo! estremeces, e teu rosto,
Teu belo rosto no meu seio inclinas,
Pálido como o lírio que ao sol posto
         Desmaia nas campinas?
Oh? vem, não perturbemos a ventura
Do coração, que jubiloso anseia...
Vem, gozemos da vida em quanto dura;
Desterremos da morte a negra ideia!
Longe, longe de nós essa lembrança!
Mas não receies o funesto corte...
         Doce amiga, descansa:
Quem ama como nós, sorri à morte.
         Vês estas sepulturas?
         Aqui cinzas escuras,
Sem vida, sem vigor, jazem agora;   
Mas esse ardor que as animou outrora,
Voou nas asas d'imortal aurora
         A regiões mais puras.
Não, a chama que o peito ao peito envia
Não morre extinta no funéreo gelo.
O coração é imenso: a campa fria
É pequena de mais para contê-lo.
Nada receies, pois: a tumba encerra
Um breve espaço e uma breve idade:
É o amor tem por pátria o céu e a terra,
         Por vida a eternidade!

António Augusto Soares de Passos (Porto, 27 de Novembro de 1826 – Porto, 8 de Fevereiro de 1860)

Ler do mesmo autor:
O Firmamento
Partida
O Noivado do Sepulcro


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