Mocidade e Morte - Castro Alves
Oh! Eu quero viver, beber perfumes
Na flor silvestre que embalsama os ares;
Ver minha alma adejar pelo infinito,
Qual branca vela na amplidão dos mares.
No seio da mulher há tanto aroma...
Nos seus beijos de fogo há tanta vida...
- Árabe errante, vou dormir à tarde
À sombra fresca da palmeira erguida.
Mas uma voz responde-me sombria :
Terás o sono sob a lájea fria.
Morrer... quando este mundo é um paraíso,
E a alma um cisne de douradas plumas:
Não! O seio da amante é um lago virgem...
Quero boiar à tona das espumas...
Vem! Formosa mulher camélia pálida,
Que banharam de pranto as alvoradas,
Minha alma é a borboleta, que espaneja
O pó das asas lúcidas, douradas...
E a mesma voz repete-me terrível,
Com gargalhar sarcástico: - Impossível!
Do sepulcro escutando triste grito
Sempre, sempre bradando-me : Maldito!
E eu morro, ó Deus! na aurora da existência,
Quando a sede e o desejo em nós palpita...
Levei aos lábios o dourado pomo,
Mordi o fruto podre do Asfaltita.
No triclínio da vida novo Tântalo
O vinho do viver ante mim passa...
Sou dos convivas da legenda hebraica,
O estilete de deus quebra-me a taça.
É que até minha sombra é inexorável,
Morrer! Morrer! Soluça-me implacável.
Adeus, pálida amante dos meus sonhos!
Adeus, vida! Adeus, glória! Amor! Anelos!
Escuta, minha irmã, cuidosa enxuga
Os prantos de meu pai nos teus cabelos.
Fora louco esperar, fria rajada
Sinto que do viver me extingue a lampa...
Resta-me agora por futuro a terra,
Por glória nada, por amor - a campa.
Adeus!... arrasta-me uma voz sombria.
Já me foge a razão da noite fria!...
in Cinco Séculos de Poesia, Antologia da Poesia Clássica Brasileira, Selecção e Introdução de Frederico Barbosa, Landy Editora
Ler do mesmo autor: Boa-Noite e O Adeus de Teresa; Adormecida
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