Ode à Língua Portuguesa - José Albano
Língua minha, se agora a minha voz levanto
Pedindo à Musa que me inspire e ajude
Somente soe em teu louvor o canto,
Inda que a lira seja fraca e rude:
E tudo quanto sinto na alma, e digo,
Já que na alma não cabe,
Contigo viva e acabe - só contigo.
Língua minha dulcissona e canora,
Em que mel com aroma se mistura,
Agora leda, lastimosa agora,
Mas não isenta nunca de brandura;
Língua do gram Camões, a que ele ensina
A sinfonia rara,
Que em tudo se compara — co´a latina.
Língua, na qual eu suspirei primeiro,
Confessando que amava, às auras mansas
E agora choro, à sombra do salgueiro,
Os meus passados sonhos e esperanças;
Na qual me fez outrora venturoso
Aquela doce fala,
Que somente escutá-la — me era um gozo.
Língua em que o meu Amor falou de Amores
Em que d'Amores sempre andei cantando,
Em que modulo os mais encantadores
E deleitosos sons de quando em quando,
E espalho acentos inda nunca ouvidos,
De mágoas e de gozos,
Murmúrios amorosos — e gemidos.
Sempre e sempre te eu veja meiga e pura,
Naquela singeleza primitiva,
Naquela verdadeira formosura,
Que farei que no verso meu reviva;
E se apenas ao mundo se revela
Um pouco desse encanto,
Há-de mostrar-lhe quanto — és rica e bela.
Outros andam o teu sublime aspeito
De ornamentos estranhos encobrindo,
Ocultando o que tens de mais perfeito
E de mais precioso e de mais lindo:
Como direi que és tu? Triste, o duvido,
E não te reconheço,
Se o teu valor e preço — jaz perdido.
Quanta e quamanha dor me surge e nasce
De nunca ouvir aquele antigo estilo;
Mas eu fiz que ele aqui se renovasse
Para que o mundo agora possa ouvi-lo.
E com todo o poder de engenho e arte
Foi sempre o meu desejo
Ver-te qual te ora vejo — e celebrar-te.
Ah! como assim me agradas e me encantas,
Suavissimamente assim gemendo;
E se te outros ofendem vezes tantas,
Embora solitário, eu te defendo:
Eu te defenderei sem ter descanso
E em luta não inglória,
Tu verás que a vitória — e a palma alcanço.
E em paga disto, peço-te que exprimas
Quanto neste meu peito vive e mora:
Dá-me versos dulcíssimos e rimas
Cheias de branda música sonora,
Dá-me uma voz melodiosa e amena,
Para que eu noute e dia
Cante minha alegria — ou minha pena.
E não quero um som alto e retumbante
Para cantar de Amor ao mundo atento,
Pois não há língua que de Amor não cante,
Mas nenhuma traduz o meu tormento;
Nenhuma se conhece em que traslade,
Senão em ti somente,
Do coração doente — a Saudade.
José de Abreu Albano (n. em Fortaleza a 12 de abril de 1882; m. em Montauban, França a 11 de Julho de 1923)
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