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2007-07-19

Arrojos - Cesário Verde faleceu há 121 anos

Fernando Pessoa no Martinho da Arcada com Raul Leal, António Botto
e Augusto Ferreira Gomes. Foto copiada de http://www.universal.pt/


Se a minha amada um longo olhar me desse
Dos seus olhos que ferem como espadas,
Eu domaria o mar que se enfurece
E escalaria as nuvens rendilhadas.

Se ela deixasse, extático e suspenso
Tomar-lhe as mãos mignonnes e aquecê-las,
Eu com um sopro enorme, um sopro imenso
Apagaria o lume das estrelas.

Se aquela que amo mais que a luz do dia,
Me aniquilasse os males taciturnos,
O brilho dos meus olhos venceria
O clarão dos relâmpagos nocturnos.

Se ela quisesse amar, no azul do espaço,
Casando as suas penas com as minhas,
Eu desfaria o Sol como desfaço
As bolas de sabão das criancinhas.

Se a Laura dos meus loucos desvarios
Fosse menos soberba e menos fria,
Eu pararia o curso aos grandes rios
E a terra sob os pés abalaria.

Se aquela por quem já não tenho risos
Me concedesse apenas dois abraços,
Eu subiria aos róseos paraísos
E a Lua afogaria nos meus braços.

Se ela ouvisse os meus cantos moribundos
E os lamentos das cítaras estranhas,
Eu ergueria os vales mais profundos
E abateria as sólidas montanhas.

E se aquela visão da fantasia
Me estreitasse ao peito alvo como arminho,
Eu nunca, nunca mais me sentaria
Às mesas espelhentas do Martinho.

in Poemas de Amor, Antologia de poesia portuguesa, organização e prefácio de Inês Pedrosa, Publicações Dom Quixote

José Joaquim Cesário Verde (n. em Lisboa a 25 Feb 1855, m. a 19 Jul 1886)

Recomenda-se vivamente a leitura de mais poemas do autor aqui Poemas de Cesário Verde (inclui Lúbrica, Avé-Maria, Contrariedades, Eu e Ela, De Tarde ... )


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