A propósito da ponte do Carnaval que aí vem...
Que vida é essa português?
Quatro dias a fio sem trabalhar!?
Mas que bela vida de burguês...
Pouco cansar e muito mandrear...
Amor, morte, poesia, política, actualidade, futebol, efemérides, solidão, paz, humor, musica...tudo e nada; Here we talk about life, love, death,
On this day in History, poetry, politics, football (soccer), solitude, peace, humour, music ... nothing and all.
Que vida é essa português?
Quatro dias a fio sem trabalhar!?
Mas que bela vida de burguês...
Pouco cansar e muito mandrear...
Da viola pra muié
É pequena a deferença.
Ancê óia, escuta e pensa.
Eu juro, esta fala é franca:
A viola tem cabelo
Nas dez corda qui ela tem.
Tale quale uma muié,
Ela tem braço também
E tem cintura e tem anca.
A viola faz chorá
E chora a hora qui qué.
Tale quale uma muié,
Derrete toda na mão
Da pessôa qui qué bem.
Só inziste duas cousa
Qui ela tem e muié não:
É qui a viola de pinho
Tem alma e tem coração…
No meu país não acontece nada
à terra vai-se pela estrada em frente
Novembro é quanta cor o céu consente
às casas com que o frio abre a praça
Dezembro vibra vidros brande as folhas
a brisa sopra e corre e varre o adro menos mal
que o mais zeloso varredor municipal
Mas que fazer de toda esta cor azul
Que cobre os campos neste meu país do sul?
A gente é previdente cala-se e mais nada
A boca é pra comer e pra trazer fechada
o único caminho é direito ao sol
No meu país não acontece nada
o corpo curva ao peso de uma alma que não sente
Todos temos janela para o mar voltada
o fisco vela e a palavra era para toda a gente
E juntam-se na casa portuguesa
a saudade e o transístor sob o céu azul
A indústria prospera e fazem-se ao abrigo
da velha lei mental pastilhas de mentol
Morre-se a ocidente como o sol à tarde
Cai a sirene sob o sol a pino
Da inspecção do rosto o próprio olhar nos arde
Nesta orla costeira qual de nós foi um dia menino?
Há neste mundo seres para quem
a vida não contém contentamento
E a nação faz um apelo à mãe,
atenta a gravidade do momento
O meu país é o que o mar não quer
é o pescador cuspido à praia à luz
pois a areia cresceu e a gente em vão requer
curvada o que de fronte erguida já lhe pertencia
A minha terra é uma grande estrada
que põe a pedra entre o homem e a mulher
O homem vende a vida e verga sob a enxada
O meu país é o que o mar não quer
II
Quando a saudade me repete as horas de infância e candidez, ha longos anos já contadas e passadas, e sempre tão presentes, renovadas na obsessão de sonhos procurando um reino de pureza onde não chegue o desengano amargo deste mundo que nos perturba a fé e o pensamento, renascem aos meus olhos claramente quantas sombras então me protegiam, quantas árvores então fôram afago do despertar das minhas ilusões e das alegrias em que me sorriam. Todas as vejo e todas me repetem a sua formosura e o seu encanto, tais quais nessa alvorada me encontraram, amando-as com um amor que só cresceu, intemerato, isento, incorruptível, sofrendo vária sorte sem mudança, a sorte mais contrária e a mais benigna. Em todos os meus passos me seguiu: foi amparo na dôr e acompanhou-me no mais rude trabalho, e no repouso, e na alegria de descuidados dias de ventura.
Aquelas mesmas árvores que amei e o acaso funesto destruiu para consumarem um heroico holocausto de bondade, essas mesmas eu vejo na lembrança, serenas e viçosas como as vi quando o meu coração as descobriu.
Lá ao fundo da encosta, onde a floresta acaba e vem o prado, ainda vejo, do alto do casal que me agasalhava, toda a espessura do pinheiro manso, a marcar o extremo do valado, cerrada e firme, quási insensível ao vento tormentoso dos invernos, e tão estreitamente unida e igual que pareciam tomadas de amizade as hastes apertadas para viverem seu diferente viver em uma só vida, a cumprirem fielmente um juramento, para afrontarem juntas o rigor e para juntas se erguerem em exaltação—comunidade mística de afecto, religioso côro de louvor, a entoarem seus hinos recitados, em severa harmonia, por um só breviário.
E à tarde, quando o sol decaía e as formas se afundavam no crepúsculo, e de manhã, quando rompia a luz àlêm dos montes e a custo ia acordando o salgueiral, a várzea e as amieiras, e ainda quando ela em nuvens se perdia e melancolicamente transformava em palidez e sombra o meio dia, sempre dos ramos do pinheiro vinha uma emanação doirada resplendente, como se o sol ali pousasse sempre, jámais o abandonasse à escuridão, e o defendesse, para que por sua vez a árvore nos desse, perpetuamente, aquela mesma luz que o sol lhe dava e nunca se apagava nos seus ramos.
A pobreza dos homens há muito arrancou já daquela terra, que esplendidamente engrandecia, o pinheiro rebusto a cuja sombra a minha mocidade, cativada de todo o seu podêr e magestade, muitas vezes pediu que lhe dissesse o segredo da sua aspiração e o mistério da sua formosura. Há muito é cinza e pó e ao pó volveu, sacrificado a chamas piedosas. Mas a perene claridade dos seus ramos que, constante, o doirava em doce esmalte, ou o sol brilhasse alto ou se ocultasse, êsse sonhar do sol que ali pousava e nunca se extinguia, êsse não se apagou nem dissipou e êsse me prende ainda e me fascina. Vive nos céus onde as estrelas vivem; de lá nos ilumina e guia em nossa estrada; perpassa etéreo em toda a imensidade repetindo-me os salmos que eu ouvi aos ramos do pinheiro murmurando sua ardente oração à luz do sol.
in SALMOS DO PRISIONEIRO, COIMBRA. F. FRANÇA AMADO, EDITOR. 1915
Jaime de Magalhães Lima (Aveiro, Vera Cruz, 15 de outubro de 1859 — Aveiro, Eixo, 26 de fevereiro de 1936)
Posted by Nothingandall at quarta-feira, fevereiro 26, 2014 0 comments
Labels: Jaime de Magalhães Lima
“Vivemos pela acção, isto é, pela vontade. Aos que não sabemos querer — sejamos génios ou mendigos — irmana-nos a impotência. De que me serve citar-me génio se resulto ajudante de guarda-livros? Quando Cesário Verde fez dizer ao médico que era, não o Sr. Verde empregado no comércio, mas o poeta Cesário Verde, usou de um daqueles verbalismos do orgulho inútil que suam o cheiro da vaidade. O que ele foi sempre, coitado, foi o Sr. Verde empregado no comércio. O poeta nasceu depois de ele morrer, porque foi depois de ele morrer que nasceu a apreciação do poeta.
Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se o não fizerem ali?"
Bernardo Soares, Livro do Desassossego
Mandaste-me dizer,
No teu bilhete ardente,
Que hás-de por mim morrer,
Morrer muito contente.
Lançaste no papel
As mais lascivas frases;
A carta era um painel
De cenas de rapazes!
Ó cálida mulher,
Teus dedos delicados
Traçaram do prazer
Os quadros depravados!
Contudo, um teu olhar
É muito mais fogoso,
Que a febre epistolar
Do teu bilhete ansioso:
Do teu rostinho oval
Os olhos tão nefandos
Traduzem menos mal
Os vícios execrandos.
Teus olhos sensuais
Libidinosa Marta,
Teus olhos dizem mais
Que a tua própria carta.
As grandes comoções
Tu, neles, sempre espelhas;
São lúbricas paixões
As vívidas centelhas...
Teus olhos imorais,
Mulher, que me dissecas,
Teus olhos dizem mais,
Que muitas bibliotecas!
Encanecida pátria de joelhos,
aqui te deixo, exausto de sofrer-te.
Vou de olhos secos, cegos de perder-te,
sossegar ódios velhos.
Vou destruir-te as lágrimas de rojos,
nas mãos e mãos inertes.
Aos que sabem a ciência de vender-te
abandono os despojos.
Vou procurar-te ao bafo de outra face
quente, clara e agreste.
Aconchego-te aos restos
da minha pele gasta de afagar-te.
Vou de jornada. Aceno
um lenço breve e incerto.
Voltarei, voltarei. Num gesto
mais rebelde e sereno.
Ergue os teus ombros, pátria de joelhos,
olha-me bem nos olhos para ver-te.
Quero levar-te e ter-te
no meu ódio já velho.
Posted by Nothingandall at segunda-feira, fevereiro 24, 2014 0 comments
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Posted by Nothingandall at segunda-feira, fevereiro 24, 2014 0 comments
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Foto: www.pousadadaespera.com.br
Fujo da sombra; cerro os olhos: não há nada.
A minha vida nem consente
rumor de gente
na praia desolada.
Apenas decisão de esquecimento:
mas só neste momento eu a descubro
como a um fruto rubro
de que, sem já sabê-lo, me sustento.
E do Sol amarelo que há no céu
somente sei que me queimou a pele.
Juro: nem dei por ele
quando nasceu.
Posted by Nothingandall at segunda-feira, fevereiro 24, 2014 0 comments
Labels: David Mourão-Ferreira
Amor de mel, amor de fel Tenho um amor Que não posso confessar... Mas posso chorar Amor pecado, amor de amor, Amor de mel, amor de flor, Amor de fel, amor maior, Amor amado! Tenho um amor Amor de dor, amor maior, Amor chorado em tom menor Em tom menor, maior o Fado! Choro a chorar Tornando maior o mar Não posso deixar de amar O meu amor em pecado! Foi andorinha Que chegou na Primavera, Eu era quem era! Amor pecado, amor de amor, Amor de mel, amor de flor, Amor de fel, amor maior, Amor amado! Tenho um amor Amor de dor, amor maior, Amor chorado em tom menor Em tom menor, maior o Fado! Choro a chorar Tornando maior o mar Não posso deixar de amar O meu amor em pecado! Fado maior Cantado em tom de menor Chorando o amor de dor Dor de um bem e mal amado!
Katia Duarte d'Almeida d’Oliveira Rosado Guerreiro nasceu a 23 de fevereiro de 1976 em Vanderbijlpark, África do Sul
Posted by Nothingandall at domingo, fevereiro 23, 2014 0 comments
Labels: Fado, Katia Guerreiro, Music, Musica
É provável, sim, é provável que ainda a ame, que ame nela o que antes soube amar, a cabeleira escura, o ventre inquietante, o peito guardando a alegria de um coração solar. Os meus olhos profundos sempre a contemplaram visivelmente perturbados, até mesmo perdidos, quando ela caminhava abrindo rasgões no ar que se fechavam depois à sua passagem para cingir-lhe os braços, os seios e as ancas. A sua boca tremeu na minha com a sede da música e o seu contacto era o do musgo e o da cinza, e dessas cerejas maduras pelo lume de maio. Não sei se estou a endeusá-la ou se ela é uma deusa. Não sei mesmo se conseguirei dizer dela quanto gostaria. Ela está tão perto do meu corpo que a minha pele se acende, e tão longe dos meus olhos que só poderei lembrá-la. Fizémos muito amor e sempre muitas vezes, sem que entre nós esvoaçasse uma minima sombra. Quando ficávamos tristes, é que o espanto crescia até ao minuto primeiro da tristeza. É uma mulher maravilhosa, o seu nome que importa?, tão frágil como um menino inocente, assim desamparada, correndo para a loucura como antes correu para os meus braços. Nenhuma paixão poderia doer-me mais. Nenhuma ternura poderia mimar-me tanto. O meu poema é uma casa erguida com a sua beleza, onde ela entra e de onde sai e algumas vezes se demora. Poderei dizer que o meu coração é uma sala vazia? A sua recordação ainda me perturba e disso tenho consciência. Amo-a ainda, ou não a amo já, é impossível dizer. Mas é provável, sim, é provável que ainda a ame.
in 'Ano Comum'
Joaquim Maria Pessoa (n. Barreiro, 22 de fevereiro de 1948)
Passo a Passo
Quero-te para além das coisas justas
Bastava-nos amar. E não bastava...
Se ao menos soubesses tudo o que eu não disse
A Ausência VIII
Dizes que meu amor te encanta a vida
Teus alvos dias, teus noturnos sonhos:
Mas tens a face de prazer tingida,
Teus lábios são risonhos!
Não podem florescer o amor e o riso
Nos mesmos lábios da paixão o fogo
Mata as rosas do rosto, de improviso
Gera a tristeza logo.
Olha: minh'alma é pálida e tristonha.
Minha fronte é nublada e sempre aflita.
Entretanto, uma imagem, bem risonha
Dentro em minh'alma habita.
Mas esse ermo sorrir que tenho n'alma.
Não é como da aurora o riso ardente:
É o sorrir da estrela em noite calma.
Brilhando docemente.
Ah! se me queres a teus pés prostrado.
Troca o riso por pálida beleza:
Mulher! torna-te o anjo que hei sonhado.
Um anjo de tristeza!
Posted by Nothingandall at sexta-feira, fevereiro 21, 2014 0 comments
Labels: Aureliano Lessa, poesia
Ó ondas do mar salgado,
D’onde vos vem tanto sal?
Vem das lágrimas choradas
Nas praias de Portugal.
in Cantigas (Lisboa: Férin, 1902)
António Correia de Oliveira nasceu em S. Pedro do Sul (Beira Alta) a 30 de julho de 1879 e morreu em Belinho (Esposende) a 20 de fevereiro de 1960.
Ler do mesmo poeta, neste blog:
A Despedida
Mãe
O Perfume
A semelhança dos dois primeiros versos do poema Mar Salgado, «Ó mar salgado, quanto do teu sal. São lágrimas de Portugal!» de Fernando Pessoa, com a quadra acima, valeu a este uma acusação de plágio.
É muito interessante o tema, objeto do estudo Vidé Mar Salgado: Fernando Pessoa perante uma acusação de plágio - José Barreto (ficheiro pdf)
Do referido estudo extrai-se que Pessoa terá em jeito de resposta escrito o poema:
Eu falei no “mar salgado”,
Disseram que era plagiado
Do Corrêa de Oliveira.
Ora, plagiei-o do mar.
Eu sou tal qual Portugal
Faz-me sempre mal o sal
E ando sobretudo com azar.
numa clara alusão a Salazar (sal+azar) também explícita no poema:
Este senhor Salazar
É feito de sal e azar.
Se um dia chove,
A agua dissolve
O sal,
E sob o céu
Fica só o azar, é natural.
Oh, c’os diabos!
Parece que já choveu…
também já publicado neste blog (ver António de Oliveira)
Posted by Nothingandall at quinta-feira, fevereiro 20, 2014 0 comments
Labels: António Correia de Oliveira
Inútil definir este animal aflito.
Nem palavras,
nem cinzéis,
nem acordes,
nem pincéis
são gargantas deste grito.
Universo em expansão.
Pincelada de zarcão
desde mais infinito a menos infinito.
Posted by Nothingandall at quarta-feira, fevereiro 19, 2014 0 comments
Labels: António Gedeão, poesia
O mundo inteiro cabe numa sílaba
e nela me refugio
para esperar a aurora.
Aprendo que Isto é Aquilo.
Não preciso aprender mais nada.
Já sei o essencial.
A noite guardou as chuvas de verão
e agora amanhece.
O dia é um voo de pássaro.
Lêdo Ivo nasceu em Maceió (AL) a 18 de Fevereiro de 1924 e faleceu em Sevilha, a 23 de dezembro de 2012.
Ler do mesmo autor, neste blog:
Soneto de Abril
O Alvo
Queixa do editor de poesia
O Acontecimento do Soneto
Como a ave que volta ao ninho antigo,
depois de um longo e tenebroso inverno,
eu quis também rever o lar paterno,
o meu primeiro e virginal abrigo.
Entrei. Um génio carinhoso e amigo,
o fantasma talvez do amor materno,
tomou-me as mãos, – olhou-me grave e terno,
e, passo a passo, caminhou comigo.
Era esta a sala... (Oh! se me lembro! e quanto!)
em que da luz nocturna à claridade,
minhas irmãs e minha mãe...O pranto
jorrou-me em ondas... Resistir quem há-de?
Uma ilusão gemia em cada canto,
chorava em cada canto uma saudade.
Posted by Nothingandall at segunda-feira, fevereiro 17, 2014 0 comments
Labels: Luís Guimarães Jr., Luiz Guimarães Jr., poesia
Manhã. Verão. Um sol rútilo, e quente.
Gritos das andorinhas no telhado.
Há no dia uma festa de noivado.
No ar, - um perfume que entontece a gente...
Do gabinete, no silêncio amado,
leio, e medito preguiçosamente.
Ouço cantar... És tu, meu lírio doente,
que vens do banho morno e perfumado.
Rumor de chita nova se quebrando...
Aromas de jasmins sobem revoltos,
enchendo a sala onde tu vais passando
e deixando uma música de avenas,
gorjeios claros de canários soltos,
frou-frou de cisnes sacudindo as pernas...
Adelmar Tavares da Silva (Recife, 16 fevereiro 1888 - Rio de Janeiro, 20 junho 1963)
Ler do mesmo autor, neste blog:
Amor
A Gente Nunca Está Só
As Estrelas (Trovas)
Fujo de mim como um perfume antigo
foge ondulante e vago de um missal
e julgo um alma estranha andar comigo,
dizendo adeus a uma aventura irreal.
Sou transparência, chama pálida, ânsia,
última nau que abandonou o cais,
No alvor das minhas mãos chora a distância
proas rachadas, longes de ouro, ideais...
Sonho meu corpo como de um ausente,
náufrago e exsurjo dentro da memória,
acordo num jardim convalescente,
vago perdido em outros num jardim,
e sinto no clarão da última glória
a sombra do que sou morrer em mim...
Posted by Nothingandall at sexta-feira, fevereiro 14, 2014 0 comments
Labels: Augusto de Campos, poesia concreta
Posted by Nothingandall at quinta-feira, fevereiro 13, 2014 0 comments
Labels: Eduardo Carranza, poesia
Ontem o Benfica ganhou de modo convincente ao seu rival da cidade. Pode-se mesmo dizer que o melhor que aconteceu ao Sporting foi ter perdido apenas por 2-0. A equipa do Sporting esteve muito desconcentrada desde o apito inicial. Poucos segundos jogados e o Benfica já criava a primeira oportunidade. Ao segundo minuto outra e eu desconfiado da ineficácia de jogos semelhantes (lembrei-me do jogo na Grécia para a Champions, um dos melhores em termos de produção de jogo e de oportunidades ... desperdiçadas) mantive-me preocupado até ao minuto 76 altura em que Enzo Perez fez avançar o marcador para 2-0.
A preocupação era pelo resultado porque pela exibição só mesmo um cataclismo milagroso poderia proporcionar um resultado positivo aos «leões»... Não fora a falta de eficácia, Gaitán (pouco depois do primeiro golo em frente a Patrício falhou o segundo), Rodrigo (aquele passe de Markovic por cima da defesa no início da segunda parte merecia a qualificação de assistência), Patrício saiu ainda como um dos melhores apesar de um alívio contra a cabeça de Lima quase ter dado o primeiro golo...
A certa altura do jogo a estatística dava em número de remates 15-1! O jogo acabou sem que o Sporting tivesse conquistado um único pontapé de canto e a única jogada em que a possibilidade de golo se deparou foi numa jogada individual de Heldon - um dos melhores do Sporting, podendo-se ainda salvar Patrício e Adrien. Os "substitutos" Dier e Piris foram duas peças inexistentes, mas a tática de Jardim não pode ficar ilibada de responsabilidades... Afinal ausência de cautelas e ambição em teoria (ou no papel) revelou-se um suicídio coletivo na prática. A equipa de Alvalade esteve irreconhecível.
No Benfica Oblak não fez uma defesa digna de registo (enfim teve de intervir em algumas bolas na sequência de cruzamentos e alguns livres). Luisão, Fejsa, Gaitan e Enzo - este o melhor em campo estiveram em excelente plano. Rodrigo também contribuiu de modo importante para o desequilíbrio leonino... mas ai os desperdícios... Apesar desses destaques individuais toda a equipa funcionou como um colectivo e dentro do esquema tactico habitual. Nada de ajustamentos inesperados para responder à novidade (com Montero e Slimani a jogar em simultâneo) do esquema do Sporting.
Da arbitragem ninguém fala mal porque não houve casos (só uns amarelitos que podiam ter sido e não foram mostrados... e um critério de marcação de faltas que não foi uniforme ao longo do tempo: no início uns toques com as mãos e uns empurrõezitos não eram suficientes para falta mas com o decurso do tempo passaram a ser). Demonstrou a maior virtude dum árbitro que é a imparcialidade...
Nas análises ... já ouvi dizer que se o jogo tivesse sido no domingo o Sporting poderia não ter perdido. Pois... se jogarem outra vez amanhã também pode não perder...
Não é difícil é explicar porque perderam ! A "cabeça no ar" dos jogadores e da equipa do Sporting (incluindo o treinador) durante o jogo foi justificada pelo receio de haver placas da cobertura do estádio a cair... Ahahahah
(Dedicado a Emíïio de Menezes)
Reparem nesse bronze, veia a veia,
Cornucópia de seios e de escama,
Obra de um japonês, em que o Fusi-Iama
Adora o mar em enluarada areia.
Canta, e essa harmonia nos golpeia.
É duma triste e solitária gama,
Porém aumenta desse bronze a fama
O olhar amortecido da sereia.
Penso que sonha o pólo e o nevoeiro,
E a pálida talhada de um crescente
Num céu de véus de noiva e jasmineiro.
E, como búzio a referver, ressoa
Numa langue preguiça de serpente,
Num êxtase nostálgico de leoa.
As túlipas são demasiado sensíveis; é inverno aqui.
Vê como tudo está branco, silencioso e calmo.
Deitada, isolada e calma vou apercebendo a quietude
enquanto a luz incide naquelas paredes brancas, nesta cama nestas mãos.
Não sou ninguém; nada tenho a ver com sobressaltos.
Entreguei o meu nome, as minhas roupas de sair às enfermeiras,
a minha história ao anestesista e o meu corpo aos cirurgiões.
Apoiaram-me a cabeça entre as almofadas e a dobra do lençol
como um olho entre duas pálpebras brancas que jamais se fecham.
Estúpida pupila, ela que tem de estar atenta tudo.
As enfermeiras vão e vêm, não perturbam,
passam com as suas toucas brancas como gaivotas voando para terra,
com as mãos sempre ocupadas, todas idênticas,
sendo assim impossível dizer quantas são.
Para elas o meu corpo é um seixo, tratam-no como a água
trata os seixos sobre os quais corre, polindo-os suavemente.
Trazem-me o torpor nas suas agulhas reluzentes, trazem-me o sono.
Neste momento perdi-me, estou cansada das minhas bagagens...
A minha maleta de couro como uma caixa de pílulas negra,
o marido e a filha sorrindo-me do retrato de família;
os seus sorrisos penetram-me na pele, como pequenos anzóis sorridentes.
Deixei a vida correr, um velho cargueiro com trinta anos
agarrando-se obstinadamente ao meu nome e endereço.
Limparam-me de todas as minhas associações afectivas.
Aterrada e nua sobre a maca acolchoada de plástico verde
vi o meu serviço de chá, as minhas cómodas de roupa branca, os meus livros
afundarem-se até os perder de vista, e a água cobriu-me a cabeça.
Sou uma freira agora, nunca fui tão pura.
Não queria flores, apenas queria
estar prostrada com as palmas das mãos para cima e ficar oda vazia.
Como me sinto livre sem que ninguém faça ideia da libertação...
A paz é tão intensa que nos entorpece
e nada exige em troca, uma etiqueta com o nome, algumas bugigangas.
Aquilo a que finalmente os mortos se agarram; imagino-os
introduzindo-as na boca como se fossem hóstias.
Mais do que tudo o vermelho intenso das túlipas fere-me.
Mesmo através do papel de celofane as ouvia respirar
suavemente, por entre as suas faixas brancas, como um bebé medonho.
A minha ferida corresponde à sua cor rubra.
São subtis: parecem pairar, embora me esmaguem,
perturbando-me com as suas línguas súbitas e a sua cor,
uma dúzia de vermelhos pesos de chumbo em volta do meu corpo.
Nunca alguém me vigiara, vigiam-me agora.
As túlipas voltam-se para mim, assim como a janela
donde, uma vez por dia, a luz se espraia e esvai lentamente,
e vejo-me, estendida, ridícula, uma sombra de papel recortado
entre o olhar do sol e o olhar das túlipas,
e, sem rosto, quis apagar-me.
As túlipas plenas de vida comem-me o oxigénio.
Antes de elas virem todo o ar era calmo,
entrando e saindo, sopro a sopro, sem alvoroço.
Então as túlipas encheram-no com um forte ruído.
O ar agora embate nelas e redemoinha como um rio
embate e redemoinha num engenho imerso e vermelho de ferrugem.
Chamam a minha atenção, que era feliz
quando se entretinha e descansava despreocupadamente.
Também as paredes parecem animar-se.
As túlipas deviam estar atrás de grades como animais perigosos;
abrem-se como a boca de um felino africano,
e é ao meu coração que estou atenta: ele abre e fecha
o seu vaso de florescências vermelhas pelo puro amor que me tem.
A água que saboreio é quente e salgada como o mar,
e vem de um país tão longínquo como a saúde.
Estou sentado á beira da estrada,
o condutor muda a roda.
Não me agrada o lugar de onde venho.
Não me agrada o lugar para onde vou.
Por que olho a troca da roda
com impaciência?
Posted by Nothingandall at segunda-feira, fevereiro 10, 2014 0 comments
Labels: Bertolt Brecht, poesia
Sobre um oceano
que tilinta
repentina
voga uma outra manhã
Dá-se aos que têm sede,
não exige pureza.
Ah!, se fôssemos puros,
p’ra melhor merecê-la…
Sabe a terra, a montanhas,
caules tenros, raízes,
e no entanto desce
da floresta dos mitos.
Água tão generosa
como a que a gente bebe,
fuja dela Narciso
e quem não tenha sede.
Posted by Nothingandall at sexta-feira, fevereiro 07, 2014 1 comments
Labels: poesia, Sebastião da Gama
O ponto é o nó do compasso
no giro aberto para a periferia
fecha e amplia a expansão do espaço
na continuidade discreta entre o fora e o dentro
como a noite alterna e continua o dia
desata e prende o movimento ao centro
Feliz quem descuidado a vida passa
No seio da opulência e do prazer
Quem nunca soube quanto amarga a taça
De empeçonhado e eterno padecer.
Feliz quem tem no coração ainda,
De um Deus piedoso, a abençoada paz,
Feliz quem nunca viu em face linda
Pérfidasd rosas de um amor falaz.
Venturoso na terra é por mil modos
Quem remorso não sente arfar-lhe o seio;
Feliz quem já morreu, mas sobre todos
Feliz quem nunca à luz do mundo veio!
São belas – bem o sei, essas estrelas,
Mil cores – divinais têm essas flores;
Mas eu não tenho, amor, olhos para elas:
Em toda a natureza
Não vejo outra beleza
Senão a ti – a ti!
Divina – ai! Sim, será a voz que afina
Saudosa – na ramagem densa, umbrosa.
Será; mas eu do rouxinol que trina
Não oiço a melodia,
Nem sinto outra harmonia
Senão a ti – a ti!
Respira – n’aura que entre as flores gira,
Celeste – incenso de perfume agreste.
Sei... não sinto, minha alma não aspira,
Não percebe, não toma
Senão o doce aroma
Que vem de ti – de ti!
Formosos – são os pomos saborosos,
É um mimo – de néctar o racismo:
E eu tenho fome e sede... sequiosos,
Famintos meus desejos
Estão... mas é de beijos,
É só de ti – de ti!
Macia – deve a relva luzidia
Do leito – ser por certo em que me deito.
Mas quem, ao pé de ti, quem poderia
Sentir outras carícias,
Tocar noutras delícias
Senão em ti – em ti!
A ti! ai, a ti só os meus sentidos,
Todos num confundidos,
Sentem, ouvem, respiram,
Em ti, por ti deliram.
Em ti a minha sorte,
A minha vida em ti;
E quando venha a morte,
Será morrer por ti.
Iannis Xenakis: Rebounds B. Der Maurer e Sebastiano de Gennaro live, 17.04.2012 Teatro San Leonardo, Bologna, Festival Angelica.
Iannis Xenakis, Greek: Ιάννης Ξενάκης; b. 29 May 1922 – d. 4 February 2001)
Foi-se na cor deste poente alado
O teu amor e o meu perdidamente.
Deixá-lo ir dormir eternamente
Como um sonho que mal fosse sonhado.
Deixá-lo ir assim, sem um pecado,
Dos outros este amor tão diferente.
Deixá-lo ir na luz deste Poente
O nosso amor meu Deus, tão desgraçado!
Deixá-lo ir assim ao fim do dia,
Como luz de penumbra ou sacristia,
Como flor que murchou sem um lamento.
Deixá-lo ir o meu amor enfim!
Deixá-lo ir meu Deus! Longe de mim
Que durma em paz no grande esquecimento
Posted by Nothingandall at segunda-feira, fevereiro 03, 2014 0 comments
Labels: Alfredo Brochado, poesia
Afirmas que brigámos. Que foi grave.
Que o que dissemos já não tem perdão.
Que vais deixar aí a tua chave
E vais à cave içar o teu malão.
Mas como destrinçar os nossos bens?
Que livro? Que lembranças? Que papel?
Os meus olhos, bem vês, és tu que os tens
Não te devolvo – é minha – a tua pele.
Achei ali um sonho muito velho,
Não sei se o queres levar, já está no fio.
E o teu casaco roto, aquele vermelho
Que eu costumo vestir quando está frio?
E a planta que eu comprei e tu regavas?
E o sol que dá no quarto de manhã?
É meu o teu cachorro que eu tratava?
É teu o meu canteiro de hortelã?
A qual de nós pertence este destino?
Este beijo era meu? Ou já não era?
E o que faço das praias que não vimos?
Das marés que estão lá à nossa espera?
Dividimos ao meio as madrugadas?
E a falésia das tardes de Novembro?
E as sonatas que ouvimos de mãos dadas?
De quem é esta briga? Não me lembro.
Posted by Nothingandall at domingo, fevereiro 02, 2014 0 comments
Labels: poesia, Rosa Lobato de Faria
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