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2017-07-28

Tempos-Juncos - Velimir Khlébnikov

Tempos-juncos
Na margem do lago,
Onde as pedras são tempo,
Onde o tempo é de pedra.
No lago da margem,
Tempos, juncos,
Na margem do lago,
Santos, juntos.

(tradução Augusto de Campos e Boris Schnaiderman)

in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o Futuro
Porto 2001 – Cidade Europeia da Cultura – Assírio & Alvim

Velimir Khlebnikov, Велими́р Хле́бников, nasceu em 9 nov, 1885 (Out. 28, 1885 (O.S.)) m. – 28 jun 1922)

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Dois Poemas da Praia da Areia Branca - Sidónio Muralha

1

Na praia da Areia Branca
os búzios não falam só do mar:
- falam das pragas, dos clamores,
da fome dos pescadores
e dos lenços tristes a acenar.

Búzios da praia da Areia branca:

- um dia,
haveis de falar
unicamente do mar.


2

No fundo do mar,
há barcos, tesoiros,
segredos por desvendar
e marinheiros que foram morenos ou loiros.

Ali, não são morenos nem loiros:
- são formas breves, a descansar,
sem ambições para os tesoiros
e de cabelos verdes dos limos do mar.

Serenos, serenos, repousam os mortos,

enquanto o mar
ensina o mundo a falar
a mesma língua em todos os portos.

Sidónio Muralha (n. Lisboa a 28 de julho de 1920 - m. Curitiba, Paraná, Brasil a 8 de dezembro de 1982)

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2017-07-27

A Tua Boca - António de Cértima

I

Nasce a manhã em teu cabelo ruivo

Palácio de perfume e pedrarias
E, Salomés acariciando as pômas
As nossas línguas ungem-se de aromas
Para o baile sagrado das orgias!

II
Sol a prumo em teus seios de férias

Alcova ideal de sádicas sereias.
E em batalhas voluptuais, violentas
As nossas línguas, húmidas, sangrentas
Sorvem um mel de cálidas colmeias

III
A tarde ajoelha no teu ventre liso

Jardim da perfumada Berenice,
Aonde as nossas línguas incendidas
Adormecem, cansadas e doridas
Num sonho de fantástica meiguice!

...Jardim da tua carne de Belkiss.


in Contemporânea, 3ª. Série, nº. 2, 1926

António de Cértima (António Augusto Gomes Cruzeiro, nasceu a 27 de Julho de 1894, no lugar da Gesta, Freguesia de Oiã, Concelho de Oliveira do Bairro; faleceu no Caramulo a 20 de Outubro de 1983)

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2017-07-26

Carícias - Francisco Bugalho

Carícias sábias minhas mãos buscaram
Por teu corpo em botão, alvorescente;
E meus lábios sonâmbulos pisaram
Branduras de veludo alvo e dormente.

Triunfos nos meus olhos despontaram,
E gritos de clarim e de trombeta
Em meus ouvidos sôfregos soaram,
Como cantos de amor dalgum poeta.

Ritmos de doçuras e quebrantos,
Corpos vergados, como dois acantos,
Gritaram alto que era doce a vida.

Apertei-te na ânsia de perder-te.
E quando regressei, voltei a ver-te:
Vi-te ainda mais longe e mais perdida.


Francisco Bugalho nasceu a 26 de julho de 1905, no Porto, e faleceu a 29 de janeiro de 1949, em Castelo de Vide.

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2017-07-25

Batuque - Henrique Guerra (na passagem do 80º. aniversário)



Na Imensidão da noite,
Longe, muito ao longe,
O som lúgubre do tambor ecoa…
Projecta-se no ar…
E corre
Salta
Voa
E num lamento profundo pelas negras terras se espalha…
Que novas trará?!
Será festa o seu significado?!
Quiçá uma dança de noivado,
O “muene” que está quase a morrer?!
Ou será guerra?!
Ou ainda a chuva, que na serra
Despontou
P’rá “machamba” não morrer!
E os negros dançam… e dançam…
À luz rubra das fogueiras
Seus corpos brilham p’lo suor,
Contorcem-se
E saltam… e saltam… e gritam,
No prazer da dança
No prazer do amor!…
Só Tandir não dança…
Nunca mais dançará!…
Distante e pensativo,
Olhos fitos na palhota de estuque
Pensa na negra Malua.
Que p’ra calar a cólera de Tumbine,
Deus da Serra
Ao som demoníaco do batuque
P’ra ele irá subir!
Esbelta e nua
A noiva de Tandir
A escultural Malua
E o ritmo soa agora mais forte,
Foge em disparada,
E ao negro distante vai anunciar
Que a hora da sacrifício chegou!…,
Tumbine espreita
Tumbine não dorme
E indiferente a Tandir,
Um riso macabro no seu rosto enorme,
Lá do alto chama Malua,
Que esbelta e nua
A serra subirá
P’ra ele a possuir!…
………………………………
Rompe a madrugada…
O tambor há muito se calou
Malua a serra já subiu
Seu corpo d’ébano Tumbine possuiu
E arrebatou sem piedade
P’ra toda a eternidade!…

Mas Malua não foi só!…
Tandir
Não resistiu à suprema dor da despedida!
Sua alma voa pelo espaço,
Unida à de Malua num abraço
Estranho e Forte…
Como a própria Morte!…

Quelimane, Outubro de 1959

Henrique Lopes Guerra nasceu em Luanda em 25 de julho de 1937

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2017-07-22

Já Marília cruel... - Basílio da Gama

Já Marília cruel, me não maltrata
saber que usas comigo de cautelas,
qu'inda te espero ver por causa delas,
arrependida de ter sido ingrata.

Com o tempo, que tudo desbarata,
teus olhos deixarão de ser estrelas;
verás murchar no rosto as faces belas
e as tranças d´oiro converter-se em prata.

Pois se sabes que a tua formosura
por força há de sofrer da idade os danos,
por que me negas hoje esta ventura?

Guarda para seu tempo os desenganos;
gozemo-nos agora, enquanto dura,
já que dura tão pouco a flor dos anos.


José Basílio da Gama (nasceu em São José do Rio das Mortes [depois São José del Rei, hoje Tiradentes], Minas Gerais, em 22 de julho de 1740; m. em Lisboa, em 31 de julho de 1795).

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2017-07-20

SOM DA LINGUAGEM - Gastão Cruz



Por vezes reaprendo
o som inesquecível da linguagem
Há muito desligadas
formam frases instáveis as

palavras
Aos excessos do céu cede o silêncio
as constelações caem vitimadas
pelo eco da fala

in "Campânula"

Gastão Santana Franco da Cruz (Faro, 20 de julho de 1941)

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Happy Birthday - Mathilde Goehler


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2017-07-19

Manias - Cesário Verde

O mundo é velha cena ensanguentada,
Coberta de remendos, picaresca;
A vida é chula farsa assobiada,
Ou selvagem tragédia romanesca.

Eu sei um bom rapaz, -- hoje uma ossada, --
Que amava certa dama pedantesca,
Perversíssima, esquálida e chagada,
Mas cheia de jactância quixotesca.

Aos domingos a deia já rugosa,
Concedia-lhe o braço, com preguiça,
E o dengue, em atitude receosa,

Na sujeição canina mais submissa,
Levava na tremente mão nervosa,
O livro com que a amante ia ouvir missa!

José Joaquim Cesário Verde (Lisboa, Madalena, 25 de fevereiro de 1855 — Lisboa, Lumiar, 19 de julho de 1886)

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2017-07-18

Natal Diferente - Cândido da Velha

Natal Diferente
I

Catedrais de luz erguidas na cidade.
Neve artificial nas montras com brinquedos.
Soa um Cântico antigo no vento da tarde
que arrefece. Em cada rosto, em cada olhar,
um não-sei-quê de pasmo nesta hora de Natal.

Não é serenidade o que se bebe pelas ruas.
Cinzenta é a cor do céu. Decerto vai chover.
No ambiente superficial
representam-se alegrias.
As notícias nos jornais agravam
o cepticismo deste Natal a haver.

Sinto-me vazio. Lasso. Sem vontade.
Uma grande ternura a boiar dentro de mim:
Lástima, piedade, amor pelos humanos?
Mas de que serve comover-me assim?

Vou aceitar este Natal, tal como está.
Com álcool. Com prazer.
Embriagar-me de luz, de sons e de ilusões.
Ser como toda a gente. E possa o mundo arder!

II

Meu Menino Jesus que deves estar no Céu
vem tiritar nas cidades sem calor.
Vem dar realidade a este dia, vem!
— Trinta e três anos e a consciência em flor.
Mas não venhas de fraldas: a Estrela já brilhou.
Traz o corpo macerado, os pulsos perfurados,
uma injúria na boca a quem te adulterou.
Não merecemos mais, acredita. Urgentemente, vem.
Disfarçadamente, para poderes ver
que só no castigo o corpo se dá bem.

Anoitece. A chuva na cidade
quebra um pouco a sofreguidão de amar.
Já pouca gente passa. As luzes no asfalto
espalmam, pouco a pouco, a angústia para o mar.

Vou aceitar este Natal, tal como está.
Com álcool, com prazer.
Embriagar-me de luz, de sons e de ilusões.
Ser como toda a gente. E possa o mundo arder!

in 'Florilégio de Natal'

Cândido Manuel de Oliveira da Velhada nasceu em 18 de julho de 1933 em Ílhavo
Poeta

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2017-07-17

ESPERANÇA, A DOS OLHOS VERDES - João José Cochofel

Esperança, a dos olhos verdes,
que ri nas folhas tenras das árvores nuas.
Esperança, lume da noite,
que trespassa de estrelas o frio das ruas.

Esperança, berço de aflitos,
que descobrem a paz no maior fundo da dor.
Esperança, razão da vida,
que traz no olhar aceso a raiva do amor.

Esperança,
a ti me dou,
a ti me confio.

Esperança
que rebrilha na água
das lágrimas em fio...

in Quatro Andamentos (1966)

João José de Mello Cochofel Aires de Campos (n. Coimbra, 17 de julho de 1919 - m. Lisboa a 14 de março de 1982)

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2017-07-14

Poética Contraditória - António Quadros



Não digas o que sabes nos teus versos,
Deixa para trás a ciência e a consciência;
Tudo aquilo que em ti não for ausência
São ideais perdidos, ou submersos.

Abandona-te às vozes que não ouves,
E liberta os teus deuses nos teus dedos;
Não busques os sorrisos, mas os medos,
E o que não for ignoto e só, não louves.

Ser misterioso e triste, é ser poeta:
Mesmo a luz que palpita nos teus cantos
É uma imagem heróica dos teus prantos.

Percorre o teu caminho até ao fundo,
E com os versos que achaste, aumenta o mundo.
Não sejas um escritor, mas um profeta.

in Viagem desconhecida (1952)

António Gabriel de Quadros Ferro, conhecido como António Quadros (Lisboa, 14 de julho de 1923 — Lisboa, 21 de março de 1993)

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2017-07-13

Esboço - Fausto Guedes Teixeira

Negro o cabelo, a fronte iluminada,
O nariz curvo, a boca pequenina,
Nos olhos escuríssimos cravada
Uma estrela no fundo da retina;

Nas faces uma rosa desmaiada
E outra rosa nos lábios purpurina,
Seus pequeninos pés os duma fada
E o seu corpo um corpinho de menina;

Todos os traços cheios de expressão,
Nas mãos um fogo estranho que lhas beija,
Porque eu lhe pus nas mãos o coração:

Eis o esboço rápido de aquela
Que, sempre que na vida alguém a veja,
Nunca mais vê ninguém senão a ela!

Fausto Guedes Teixeira (n. freguesia de Almacave, em Lamego, 11 de outubro de 1871 — m. Lamego, 13 de julho 1940)

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2017-07-12

Se Tu Me Esqueceres - Pablo Neruda



Quero que saibas
uma coisa.

Tu já sabes o que é:
se olho
a lua de cristal, o ramo rubro
do lento outono em minha janela,
se toco
junto ao fogo
a implacável cinza
ou o enrugado corpo da madeira,
tudo me leva a ti,
como se tudo o que existe
aromas, luz, metais,
fossem pequenos barcos que navegam
para essas tuas ilhas que me aguardam.

Pois ora,
se pouco a pouco deixas de me amar,
de te amar, pouco a pouco, deixarei.

Se de repente
me esqueces,
não me procures,
já te esqueci também.

Se consideras longo e louco
o vento de bandeiras
que canta em minha vida
e te decides
a me deixar na margem
do coração no qual tenho raízes,
pensa
que nesse dia
a essa hora
levantarei os braços
me nascerão raízes
procurando outra terra.

Porém,
se cada dia,
cada hora,
sentes que a mim estás destinada
com doçura implacável.
Se cada dia se ergue
uma flor a teus lábios me buscando,
ai, amor meu, ai minha,
em mim todo esse fogo se repete,
em mim nada se apaga nem se esquece,
do teu amor, amada, o meu se nutre,
e enquanto vivas estará em teus braços
e sem sair dos meus.

Tradução de: Thiago de Mello
Extraído de Os Versos do Capitão; Impresso no Brasil, 2004 - 8ª. edição EDITORA BERTRAND BRASIL LTDA.

Pablo Neruda [Ricardo Eliecer Neftalí Reyes Basoalto] (n. 12 julho de 1904, Parral, Chile; m. 23 de setembro 1973 em Santiago, Chile).

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2017-07-11

Indiferença - Guilherme de Azevedo


Hoje, voltas-me o rosto, se ao teu lado
passo. E eu, baixo os meus olhos se te avisto.
E assim fazemos, como se com isto,
pudéssemos varrer nosso passado.

Passo esquecido de te olhar, coitado!
Vais, coitada, esquecida de que existo.
Como se nunca me tivesses visto,
como se eu sempre não te houvesse amado.

Mas, se às vezes, sem querer nos entrevemos,
se quando passo, teu olhar me alcança
se meus olhos te alcançam quando vais.

Ah! Só Deus sabe! Só nós dois sabemos.
Volta-nos sempre a pálida lembrança.
Daqueles tempos que não voltam mais!

Guilherme de Andrade e Almeida (n. em Campinas, SP, a 24 de julho de 1890; m. em São Paulo, SP, a 11 de julho de 1969).

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2017-07-10

Mar - Laureano Silveira


Há um retrato de grupo muito particular
que me é especialmente caro,
algo assombroso
e que eu guardo em frente
a certos livros, numa estante
que confina com a passagem para a varanda
de onde se avista o mar
em minha casa.

Quando o olho vejo o mar
que instantaneamente assalta
a periferia da visão
e perturba levemente
a relação de transparência
que eu desejaria estabelecer
com as personagens.

Quando, pelo contrário, olho o mar
vejo-as a elas
e as figuras ascendem à condição de viventes
na reminiscência
e na memória.

E contudo
eu desconheço-as.
Formam um grupo anónimo
que recortei de um lugar
onde as acompanhava a sua história.
Que não li.

São três homens de meia idade,
duas jovens mulheres,
uma criança.

Não sei porque os amo.
Sei que estão todos mortos.

(in Ao Porto. Colectânea de Poesia sobre o Porto; ed. Dom Quixote, 2001)

Laureano Manuel Fernandes da Silveira, nasceu no Porto em 10 de julho de 1957, faleceu no Porto em 5 de junho de 2008

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2017-07-08

Amor e Providência - Manuel de Arriaga



Enquanto eu, alta noite, velo e lido,
Por vós mantendo inúmeros cuidados,
Dormis, caros filhinhos, sossegados
Em torno a mim o sonho apetecido!
Dormis?! sonhais de certo... e eu pai envido
Meus esforços por ver realizados
Vossos sonhos gentis e perfumados:
Ampara-vos um peito estremecido.
Outro Alguém faz por nós o que eu vos faço:
Com suprema bondade e sapiência,
Rege os mundos que rolam pelo espaço!
Esse Alguem é o Amor por excelência,
O formidável e invisível braço,
E o olhar que nunca dorme - a Providência!

in Cantos Sagrados

Manuel José de Arriaga Brum da Silveira e Peyrelongue (nasceu na cidade da Horta, Açores a 8 de julho de 1840 — m. em Lisboa, 5 de março de 1917)

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2017-07-07

A. L. - Guerra Junqueiro

Não és a flor olímpica e serena
Que eu vejo em sonhos na amplidão distante;
Não tens as formas ideais de Helena,
As formas da beleza triunfante;

Não és também a mística açucena,
A alva e pura Beatriz do Dante;
És a artista gentil, a flor morena
Cheia de aroma casto e penetrante.

Não sei que graça, que esplendor, que arpejo
Eu sinto dentro d'alma quando vejo
Teu corpo aéreo, matinal, franzino...

Faz-me lembrar as vívidas napeias,
E as formas vaporosas das sereias
Rendilhadas num bronze florentino.

Abílio Manuel Guerra Junqueiro (Ligares, Freixo de Espada à Cinta, 15 de setembro de 1850 — Lisboa, 7 de julho de 1923)

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2017-07-06

Please hold onto... - Tyler Knott Gregson


Tyler Knott Gregson was born in Newport News, Virginia, July 6, 1981

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2017-07-05

O Espelho - Mia Couto



Esse que em mim envelhece
assomou ao espelho
a tentar mostrar que sou eu.

Os outros de mim,
fingindo desconhecer a imagem,
deixaram-me a sós, perplexo,
com meu súbito reflexo.

A idade é isto: o peso da luz
com que nos vemos.

António Emílio Leite Couto [Mia Couto] nasceu na cidade da Beira, em Moçambique, em 5 de julho de 1955.

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2017-07-04

O Meu Algarve (excerto) - João Lúcio

Natureza imortal, tu que soubeste dar
Ao meu país do sul a larga fantasia,
Que ensinaste aqui as almas a sonhar
Nessa frescura sã da crença e da alegria:

Que inundaste de azul e mergulhaste em oiro
Esta suave terra heróica dos amores,
Que lançaste sobre ela o canto imorredoiro
Que vibra a sinfonia oriental das cores:

Tu que mostraste aqui mais do que em toda a parte
O intenso poder do teu génio fecundo,
Que fizeste este Céu para inspirar a Arte
E lhe deste por isso o melhor sol do mundo:

Ensina algum pintor a fixar nas telas
Este brilho, esta cor, inéditos, diversos,
E põe a mesma luz que chove das estrelas
Na pena que debuxa estes humildes versos.

João Lúcio Pousão Pereira (Olhão, 4 de julho de 1880 - Olhão, 26 de outubro de 1918)

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2017-07-03

Ironia do Coração - Luís Murat


Como estavas formosa entre o mar e a minh'alma!
Ias partir... no céu vinha rompendo a aurora.
Eu te pedia - luz, tu me pedias - calma;
Eu te dizia: - "Crê"; tu me dizias: - "Chora!"

Beijei-te as mãos, beijei-te os pequeninos pés,
Como os lábios de um padre um assoalho sagrado.
Longe, ouvia-se ainda, entre os caramanchéis,
A melodiosa voz do luar apaixonado.

"É a voz do nosso amor, nos esponsais das flores.
Não chores mais, acalma a tua ansiedade.
Assim, como hei de eu dar tréguas às minhas dores,
E recalcar no peito esta amarga saudade?"

Partiste... Sobre mim cerrou-se a escuridão.
E eu não ouso subir aos meus sonhos agora,
Porque, irônico e mau, me grita o coração,
Quando não creio: "crê!", quando não choro: "chora!"

Poesias escolhidas, 1917

Luís Morton Barreto Murat (nasceu em Resende, RJ, em 4 de maio de 1861, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 3 de julho de 1929).

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