O Meu Vestido de Veludo Com Rendas Brancas - Joaquim Paço d'Arcos
Quando eu era pequenino
Tinha um vestido de veludo com rendas brancas.
Ia a passeio com o vestido de veludo
E tinha os cabelos loiros
da cor dos teus cabelos loiros.
O vestido era igual ao teu vestido,
As rendas eram iguais às tuas rendas.
Mas eu era pequenino e perdi o vestido,
E cortei os caracóis loiros.
A minha mãe guardou as rendas num baú,
para o meu irmão que ainda era mais pequenino.
E nunca mais me lembrei das rendas
até que te encontrei.
E então vi-te com o vestido preto
e as rendas da minha infância,
E os cabelos loiros, platinados,
de caracóis de criança.
E lembrei-me dos anos todos que passaram
desde que me perdi até que te encontrei,
E lembrei-me dos luares como este luar dourado,
Mas sem as rendas do teu vestido
e sem o loiro dos teus cabelos.
E por isso este luar é afinal mais dourado
Porque tem o oiro dos teus cabelos.
E eu tenho a saudade das minhas rendas
e dos veludos que perdi,
A saudade que vem do longe da minha infância,
Até à vereda, ao luar, em que te encontrei a ti.
Dá-me os meus veludos, minhas rendas brancas,
Dá-me o oiro da infância que perdi,
Tudo que guardas e foi meu em lembrança distante,
Tudo que cobre o teu corpo de amante
E em saudade possuí.
in Poemas Imperfeitos
Joaquim Belford Correia da Silva (Paço d'Arcos) (Lisboa, 14 de junho de 1908 - Lisboa, 10 de junho de 1979)
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