Páginas

2010-02-25

Nós III - Cesário Verde (na passagem do 155º aniversário)

Tínhamos nós voltado à capital maldita,
Eu vinha de polir isto tranquilamente,
Quando nos sucedeu uma cruel desdita,
Pois um de nós caiu, de súbito, doente.

Uma tuberculose abria-lhe cavernas!
Dá-me rebate ainda o seu tossir profundo!
E eu sempre lembrarei, triste, as palavras ternas,
Com que se despediu de todos e do mundo!

Pobre rapaz robusto e cheio de futuro!
Não sei dum infortúnio imenso como o seu!
Vi o seu fim chegar como um medonho muro,
E, sem querer, aflito e atónito, morreu!

De tal maneira que hoje, eu desgostoso e azedo
Com tanta crueldade e tantas injustiças,
Se inda trabalho é como os presos no degredo,
Com planos de vingança e ideias insubmissas.

E agora, de tal modo a minha vida é dura,
Tenho momentos maus, tão tristes, tão perversos,
Que sinto só desdém pela literatura,
E até desprezo e esqueço os meus amados versos!


in Cem Poemas Portugueses do Adeus e da Saudade, selecção, organização e introdução de José Fanha e José Jorge Letria

José Joaquim Cesário Verde (n. em Lisboa a 25 de Fev 1855; m. Lisboa, 19 Jul 1886).

Ler ainda do mesmo autor, neste blog:
Cobertos de folhagem na verdura...
Arrojos
Lúbrica
CONTRARIEDADES
Ave - Maria
Vaidosa
De Tarde

Sem comentários:

Enviar um comentário