Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão
Porque os outros têm medo mas tu não
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.
SOPHIA de Mello Breyner ANDRESEN nasceu no Porto a 6 de Novembro de 1919, de ascendência dinamarquesa. Frequentou Filologia Clássica na Faculdade de Letras de Lisboa, mas não concluiu o curso. Estreou-se nas letras com «Poesia» (1944). Traduziu Dante («Purgatório»), Shakespeare («Hamlet»), Claudel («Anunciação a Maria»), e verteu para francês poemas de Camões, Cesário, Pessoa e Sá-Carneiro («Quatre Poètes Portugais», P.U.F., 1970). Foi influenciada por Hölderlin, Rilke, Pascoaes, Pessoa e Cecília Meireles. A sua poesia é distante e apaixonada, concisa e eloquente, fluente e escultural; em suma, poesia pura, reveladora de uma rara exigência de essencialidade. O seu ideal é de depuração e contenção, despojamento e sobriedade. Poesia órfica, já que o poeta é um medianeiro e o ofício poético uma celebração (magia e exorcismo, paganismo helénico e expressão clássica). Em 1999, foi galardoada com o prémio Camões.
Poema extraído de «Os poemas da minha vida - Diogo Freitas do Amaral, Público». Nota biobibliográfica extraída de «A Circulatura do Quadrado - Alguns dos Mais Belos Sonetos de Poetas cuja Mátria é a Língua Portuguesa. Introdução, coordenação e notas de António Ruivo Mouzinho. Edições Unicepe - Cooperativa Livreira de Estudantes do Porto, 2004.
Outros poemas da mesma autora aqui no blog:
Promessa
Liberdade
Soneto
Pudesse eu
Partida
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