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2013-09-03

Mesa da Solidão - Raul de Carvalho

Ao prato sequioso de frutas e de sumo
que ponho sempre na mesa aonde estou
fugazes são as mãos que para mim
se estendem e trocam
laranjas por rosas
oferta por oferta
Fugazes são as mãos! pois ninguém vê
o brilho inextinguível que as precede
e que só pede um pouco
de amor ou gratidão

Se me levanto e me despeço
fica deserta a mesa
fica um homem de pé olhando a mesa
ficamn na mesa os frutos que sorriem!

As quatro paredes do meu quarto
que são as quatro ondas que circundam
que são as quatro velas que balouçam
o navio da minha vida

Dedico o pensamernto e o olhar.

O meu destino foi
o de abandoinbar-me sem refúgio.

Como é possível que ninguém veja
teus olhos de criança doida
que pedem a toda a gente
que os não deixe
voar
ou cair?

Ah! a um poeta ninguém pode
segurá-lo pela aba
do casaco
porque ele dá um pinote
e - quando menos se espera
está no céu!

Nuvens e rosas
te tocam! lisas
no chão que olhas
no céu que pisas.

Para quê tanta pressa no andar?
Para quê tanta esperança incendiada?
A solidão está à tua espera
ainda levantada.

Porque o desejo cansa quando é tanto
que não pode parar
feliz do que deseja e a seguir
deixa de desejar.

Sou como tu
ó meu secreto amigo René Guy Cadou

Sinto-me bem com Deus quando estou só.


(Mesa da Solidão, 1955)
 in Poemas Portugueses Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI, Porto Editora

Raul Maria Penedo de Carvalho (n. em Alvito, Baixo Alentejo, a 4 de Setembro de 1920; m. no Porto a 3 de Setembro de 1984).

Ler do mesmo autor, neste blog:
Guio-me
Amíude
Quando eu nasci, minha Mãe
Coração Sem Imagens;
Serenidade És Minha

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