Lamento nº. 1
Onde estão os teus olhos – onde estão? – Oh – milagre de amor que escorres dos meus olhos!
Na água iluminada dos rios da lua eu os vi descendo e passando e fugindo
Iam como as estrelas da manhã. Vem, eu quero os teus olhos, meu amor!
A vida... sombras que vão e sombras que vêm vindo
O tempo... sombras de perto e sombras na distância – vem, o tempo quer a vida!
Onde ocultar minha dor se os teus olhos estão dormindo?
Onde está tua face? Eu a senti pousada sobre a aurora
Teu brando cortinado ao vento leve era como asas fremindo
Teu sopro tênue era como um pedido de silêncio – oh, a tua face iluminada!
Em mim, mãos se amargurando, olhos no céu olhando, ouvidos no ar ouvindo
Na minha face o orvalho da madrugada atroz, na minha boca o orvalho do teu nome!
Vem... Os velhos lírios estão fanando, os lírios novos estão florindo...
Intermédio
Sob o céu de maio as flores têm sede da luz das estrelas
Os róseos gineceus se abrem na sombra para a fecundação maravilhosa...
Lua, ó branca Safo, estanca o perfume dos corpos desfolhados na alvorada
Para que surja a ausente e sinta a música escorrendo do ar!
Vento, ó branco eunuco, traz o pólen sagrado do amor das virgens
Para que acorde a adormecida e ouça a minha voz...
Lamento nº. 2
Teu corpo sobre a úmida relva de esmeralda, junto às acácias amarelas
Estavas triste e ausente – mas dos teus seios ia o sol se levantando
Oh, os teus seios desabrochados e palpitantes como pássaros amorosos
E a tua garganta agoniada e teu olhar nas lágrimas boiando!
Oh, a pureza que se abraçou às tuas formas como um anjo
E sobre os teus lábios e sobre os teus olhos está cantando!
Tu não virás jamais! Teus braços como asas frágeis roçaram o espaço sossegado
Na poeira de ouro teus dedos se agitam, fremindo, correndo, dançando...
Vais... teus cabelos desvencilhados rolam em onda sobre a tua nudez perfeita
E toda te incendeias no facho da alma que está queimando...
Oh, beijemos a terra e sigamos a estrela que vai do fogo nascer no céu parado
É a Música, é a música que vibra e está chamando!
Extraído de Vinicius de Moraes - Antologia Poética, Publicações Dom Quixote
Vinicius de Moraes (n. Rio de Janeiro a 19 Out 1913; m. Rio de Janeiro, 9 Jul 1980)
Ler neste blog do/sobre o autor:
Se o amor quiser voltar
Soneto da Separação
Saudades do Brasil em Portugal
Soneto do Amor Total
Poética I
Mar
Poema de Todas as Mulheres
Soneto de Fidelidade
Pela luz dos olhos teus
Dialectica
Aquarela
Amigos
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