O dia leva a noite,
E a noite escura
Leva o dia luzente
Em sombra obscura.
O Outono segue o Verão,
E os vendavais
Cessam findos que estão
Os temporais.
Mas a febre de amor
Que me tortura
Mantém o seu vigor,
E assim perdura.
Deus, para mim lançaste
A tua seta,
Porque não a apontaste
A outra meta?
Persegue os desleixados,
Deles abusa;
Não eu, nem os amados
Pela Musa.
Ai, liberta-me então
Desta megera
Que mais ri, se aflição
Vê que me gera.
Devolve a claridade
Ao meu negrume,
E nesta triste idade
Repõe o lume.
Amor dá um sustento
Ao meu pensar:
Impede com melhor vento
Meu naufragar.
Pois quanto mais eu choro
Mais me rejeita,
E quanto mais a imploro
Menos me aceita.
Nem minha cor febril
De amor em vão
Levou a tão hostil
À compaixão.
Nem a viola tocar
Ao seu portão,
Nem as noites passar
No duro chão.
Menos cruel é a sorte
Da água revolta
Que por ela, se forte
O vento a solta.
Arma-se de beleza
E assim pensa
Ver da sua crueza
A recompensa.
Sê firme uma só vez,
E dela inflama
O coração talvez
Com essa chama,
Que uma irmã acendeu
Muito indiscreta,
E de ardor corroeu
Rainha em Creta.
Tradução de Filipe Jarro
in Rosa do Mundo, 2001 Poemas para o Futuro, Assírio & Alvim
PIERRE DE RONSARD (n. 11 Sep 1524, Vendômois, França; m. perto de Tours, 27 Dez. 1585)
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