Páginas

2006-03-01

Ao longe os barcos de flores - Camilo Pessanha

Só, incessante, um som de flauta chora,
Viúva, grácil na escuridão tranquila.
-Perdida voz que de entre as mais se exila
-Festões de som dissimulando a hora

Na orgia, ao longe, que em clarões cintila
E os lábios, branca, do carmim desflora...
Só, incessante, um som de flauta chora,
Viúva, grácil, na escuridão tranquila.

E a orquestra? E os beijos? Tudo a noite, fora,
Cauta, detém. Só modulada trila
A flauta fébil... Quem há-de remi-la?
Quem sabe a dor que sem razão deplora?

Só, incessante, um som de flauta chora...

in Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa, de Eugénio de Andrade,
Campo das Letras

Camilo Pessanha (n. Coimbra 7 Set 1867; m. Macau 1 Mar 1926)

Ler do mesmo autor:
Quem poluiu, quem rasgou os meus lençóis de linho
Floriram por engano as rosas bravas
Interrogação

Sem comentários:

Enviar um comentário