Quarto sem luz, dum ar viúvo e frio...
Tenho a cabeça, enfebrecida, a arder.
O sono hoje não desce, a apaziguar-me.
Pelo silêncio, a espaços, dando alarme,
Anda um confuso som, de entontecer.
Procuro companhia com que esqueça
Esta vida de só, de abandonado.
Sonho um corpo florido, crepitante,
De carne moça e viva de bacante,
Sem túnica, num sonho depravado...
Penso que me abre a porta, lentamente,
Impondo-me, em silêncio, amplos assombros,
E que, nervosa, se dirige ao leito
- Como um ramo gentil todo desfeito
Os seus cabelos soltos pelos ombros.
E chega todo trémulo, radioso,
Numa graça aromática e ligeira.
Toda a alcôva estremeça e se perfuma
De olôr que embriaga... e me envenena em suma
Como um bouquet bizarro à travesseira.
Mas tarda... Oh sonhos vãos!... Porém, teimando,
O sonho não me larga, a enfebrecer;
O corpo que eu criei e me apetece
Grita no escuro, o aroma me enlouquece
Vermelho ramalhete, ao fundo a arder...
Francisco Paulino Gomes de Oliveira, nasceu em Setúbal a 22 de junho de 1864, faleceu em 13 de março de 1914*, em São Paulo, no Brasil).
Raramente se encontra divulgada a data de falecimento do poeta. A de 13 de março de 1914 é referida neste estudo feito mais a propósito da sua mulher Ana de Castro Osório
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