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2014-10-08

Correspondência - Alberto de Serpa

Para quem, estas horas que descem da torre da igreja?
Para onde as arrasta este vento manso que não se ouve?
Vão pelo ar suspensas, inúteis, em nuvem invisível,
a fazer mais profundo e mais longo o silêncio que fica...

Os sentidos de quem dorme são para os sonhos,
e, sob o luar claro de noite provinciana,
os anjos da guarda marcam, com suas asas, um ritmo de poesia circunstancial.
Dormem as crianças com sorrisos nos lábios,
dormem os homens com um caminho fácil em frente,
dormem as mulheres com o amor a abrir o coração.

As horas que descem da terra são para a luz daquela janela,
onde, talvez, um homem espera a hora sem hora da morte,
onde, talvez, uma mulher chora sobre cartas de longe,
onde, talvez, uma criança vem a este mundo de sonhos impossíveis.

Há horas que vêm mortas das torres em noites de luar,
e há almas que, como certas grutas perdidas, fazem eco.

in A Vida é o Dia de Hoje (1939)

Alberto de Serpa Esteves de Oliveira (nasceu no Porto a 12 de dezembro de 1906 - m. na mesma cidade a 8 de outubro de 1992)

Ler do mesmo autor, neste blog:
Amores Infelizes
Incerteza
Um Jovem Camarada
Poema III
Interferência
Névoa

1 comentário:

Mar Arável disse...

pelo sonho é que vamos

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