Como sombra que passa fugitiva
Olhos fitos nas pedras da calçada -
Lá vai ela - a Condessa pensativa
Em seu cismar infindo mergulhada!...
Os transeuntes param só por vê-la;
E cada um, ao contemplá-la diz:
«Isto não é mulher...é uma estrela!»
«Um ente assim, como há-de ser feliz!»
Ao banquete de finas iguarias
Onde as flores se espalham nos cristais
Ocultando profundas agonias,
A Condessa engole amargos ais!
Mas os convivas forçam-lhe o sorriso,
E cada um, ao contemplá-la diz:
«Não há mais bela flor no paraíso!»
«Um ente assim...como há-de ser feliz!»
Vibra do baile no ar o mago encanto,
Resplandece a alegria nos semblantes:
Só a Condessa a custo gela o pranto
Que borbulha em seus olhos rutilantes!
As donzelas cobiçam-lhe a frescura,
E cada uma, ao contemplá-la diz:
«Tão rica e formosa... que ventura!»
«Um ente assim... como há-de ser feliz!»
Mas sobre a fria e solitária lousa
Altar funéreo d'um amor ardente
A altas horas a Condessa ousa
Gemer... carpir... chorar eternamente!
E alevantando o seu olhar discreto,
Triste... o coveiro, ao contemplá-la diz:
«Só eu conheço o teu pesar secreto,
Mísera amante... e chamam-te feliz!»
in Poetisas Portuguesas, Nuno Catharino Cardoso, Lisboa. Livraria Scientífica, 1917
Mécia Mousinho de Albuquerque, nasceu em Lisboa, 1870; morreu em Lisboa, 1961
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