Teu corpo de âmbar, gótico, afilado,
Sempre velado de cheirosos linhos,
Teu corpo, aprilino prado,
Por onde o meu desejo, pastor brando,
Risonho há-de viver, pastoreando
Meus beiços, desinquietos cordeirinhos,
Teu corpo é esbelto, ó zagala esguia,
Como as harpas que o pai de Salomão tangia!
Teu corpo eléctrico, ogival,
Núbil, sequinho, perturbante,
É uma dispensa real:
Os teus olhos são duas cabacinhas
Cheias dum vinho estonteante
Os teus dentes são alvas camarinhas,
Os teus dedos, suavíssimos espargos,
E os teus seios, pêssegos verdes mas não amargos.
Lira de nervos, glória das trigueiras,
Como tu és graciosa! As laranjeiras
Desde que viste o sol com esses sóis amados
Só vinte vezes perfumaram noivados!
Nobre e graciosa és, morena das morenas,
Como as senhoras dos olhos belos,
Que passeavam nos jardins de Atenas
Com uma cigarra de ouro nos cabelos!
Como tu, eu sou moço! e atrevido
Com Anceu, rei de Samos
E jamais caçador me fez vencido
Quando, caçando o javali ando entre os ramos.
O meu peito é de jaspe, a minha voz macia,
Meus olhos ágeis e dourados como abelhas
E, para que as colhas, minha boca sadia
É um orvalho cabazinho de groselhas
Novos e alegres somos! Ah! que em breve
Nossas bocas se colem voluptuosas;
Vamos sonhar e toucar-nos de rosas
Enquanto há sol, enquanto não cai neve!
Não te demores,
Ó cheia de graça,
Que os dias correm voadores
E a mocidade passa...
A mocidade passa...e, um dia ó meus pecados,
A tua boca vermelha
Será uma rosa velha,
E minhas mãos uns lírios fanados...
E então, velhinhos combalidos,
Como dois galhos ressequidos
Sem folhasd e sem pomos
Lembrar-nos-emos do que hoje somos,
Ó maravilha de graciosidade
Como dum filho e duma filha
Que nos morressem na flor da idade!
in Poemas Portugueses Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI,
Porto Editora
Eugénio de Castro>(n. em Coimbra a 4 Março de 1869; m. em Coimbra, a 17 de Agosto de 1944).
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Presságios
Epígrafe
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