Macário contou-me o que o determinara mais precisamente àquela resolução profunda e perpétua. Foi um beijo. Mas esse caso, casto e simples, eu colo-o: mesmo porque a única testemunha foi uma imagem em gravura da Virgem, que estava pendurada no seu caixilho de pau-preto, na saleta escura que abria para a escada... Um beijo fugitivo, superficial, efémero. Mas isso bastou ao seu espírito recto e severo para o obrigar a tomá-la como esposa, a dar-lhe uma fé imutável e a posse de sua vida. Tais foram os seus esponsais. Aquela simpática sombra das janelas vizinhas tornara-se para ele um destino, o fim moral da sua vida e toda a ideia dominante do seu trabalho. E esta história toma, desde logo, um alto carácter de santidade e de tristeza.
in Singularidades de uma Rapariga Loura
Extraído de Beija-me, uma antologia literária, 101 Noites
José Maria de Eça de Queirós (Póvoa de Varzim, 25 de novembro de 1845 — Paris, 16 de agosto de 1900).
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