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2008-05-04

O Poder das Lágrimas - Luís Murat


Com que saudade para o céu não olhas,
vendo de nuvens todo o céu coberto
e engastadas de pérolas as folhas
e o coração das árvores deserto!

Como uma grande rosa, a alma desfolhas
dentro do seio, inteiramente aberto,
e esses restos de flor passando molhas
n’água do arroio, que coleia perto.

Molha-as, sim, nessa linfa algente e casta!
Que uma só gota cristalina basta
para o calor em chuva ir transformando.

Hás de ficar com olhos rasos d’água,
a dor há de acalmar, que a própria mágoa
tem dó de ver uma mulher chorando.

LUÍS Norton Barreto MURAT nasceu em Itaguaí (RJ) a 4 de Maio de 1861 e morreu hemiplégico no Rio de Janeiro a 3 de Julho de 1929. Formado pela Faculdade de Direito de São Paulo em 1885, foi republicano e abolicionista. Participante do movimento revolucionário de 1893, andou refugiado e exilou-se em Buenos Aires mas, depois de julgado, foi absolvido. Indiferente ao parnasianismo, então vigente, estabeleceu a ponte entre o Romantismo e o Simbolismo. Influenciado a princípio por Victor Hugo, acabou dominado pela ideologia do místico sueco Swedenborg. Ninguém diria, ao ler «O Poder das Lágrimas», que transcrevemos, que o seu autor detestava os sonetos.

Soneto e nota biobliográfica extraídos de «A Circulatura do Quadrado - Alguns dos Mais Belos Sonetos de Poetas cuja Mátria é a Língua Portuguesa. Introdução, coordenação e notas de António Ruivo Mouzinho. Edições Unicepe - Cooperativa Livreira de Estudantes do Porto, 2004.


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