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2008-03-22

Vão as águas nostalgicas do rio... - Cabral do Nascimento

Barco Rabelo


Vão as águas nostálgicas do rio…
Vão e sobre elas, a correr com elas,
distingo ainda, ao longe, as claras velas
de um ligeiro, fantástico navio.

Lá vai! Aonde? A que país sombrio?
Ou a que praias rútilas e belas
irá tocar, à luz de mil estrelas?
Sabe-lo, ó mar? E tu, luar de estio?

Ninguém sabe, só Deus, mas eu agouro
que, em certo dia azul, azul e ouro,
há-de o navio balouçar num porto.

Há-de chegar, como ao final de um sonho,
de brancas velas, plácido e risonho
por fora e, dentro, o capitão já morto…

João Cabral do Nascimento nasceu no Funchal (ilha da Madeira) a 22 de março de 1897 e faleceu em Lisboa a 2 de março de 1978. Matriculou-se em 1915 na Faculdade de Direito de Lisboa mas, havendo interrompido o curso durante a 1.ª Guerra Mundial, só o concluiu em 1922 em Coimbra. Pouco advogou, porém, e acabou por se dedicar ao magistério no ensino técnico profissional, de que se aposentou em 1958. Ganhou, em 1943, o prémio Antero de Quental do S.N.I. (o mesmo galardão que distinguira a «Mensagem» de Fernando Pessoa), com o «Cancioneiro», que, editado em 1963, conheceu uma reedição em 1976. Considerado o poeta do instante, da inexorável passagem do tempo, da vanidade e do desengano, a sua poesia é feita de solilóquio e rigor. Modernista classicizante ou tradicionalista, foi também um notável antologista e um exímio tradutor de língua inglesa.

Soneto e Nota biobliográfica extraídos de «A Circulatura do Quadrado - Alguns dos Mais Belos Sonetos de Poetas cuja Mátria é a Língua Portuguesa. Introdução, coordenação e notas de António Ruivo Mouzinho. Edições Unicepe - Cooperativa Livreira de Estudantes do Porto, 2004.

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