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2006-12-09

A Lucidez Perigosa - Clarice Lispector

Aderindo à sugestão e desafio de Cris Penaforte - In the Name of Love e de Lino Resende que organizaram uma blogagem colectiva para comemorar o aniversário (em 9 de Dezembro de 1920) e a morte (em 10 de Dezembro de 1977 ) da grande escritora Clarice Lispector, e enquadrando-se na linha editorial deste blog, publicamos hoje o poema A Lucidez Perigosa, da sua autoria, antecedida de uma citação:


Clarice Lispector

«... porque sempre penso, com muita estranheza aliás, que talvez a vida seja a morte e quando a gente morre, acorda e vive, com medo de morrer, quer dizer, de tornar a viver ...» Clarice Lispector.


Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.

Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
- já me aconteceu antes.

Pois sei que
- em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade -
essa clareza de realidade
é um risco.

Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve
para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.

Clarice Lispector (n. em Tchechelnik, Ucrânia a 10 Dez 1920; m. no Rio de Janeiro a 9 Dez 1977)

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